STF valida lei que permite a divulgação do nome de devedores contumazes

Enviado Segunda, 25 de Agosto de 2025.

Tema foi levado ao Supremo por meio de ação proposta pelo Partido Social Liberal

A maioria dos ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) votou pela validade de norma estadual que autoriza a divulgação de nomes de devedores contumazes de ICMS. Em julgamento realizado no Plenário Virtual, os ministros analisaram uma legislação gaúcha que prevê a publicação dos nomes dos inadimplentes na página da Secretaria da Fazenda do Estado na internet, além de informações sobre a condição de devedor nas notas fiscais emitidas pelas empresas.

O tema foi levado ao Supremo por meio de ação proposta pelo Partido Social Liberal (PSL) contra o governador do Rio Grande do Sul. Mas vários Estados como São Paulo, Rio de Janeiro, Paraná, Mato Grosso do Sul, Piauí, Pernambuco, Mato Grosso, Rondônia, Sergipe, Maranhão, Pará, Amazonas e Minas Gerais foram admitidos como parte interessada no processo (ADI 4854).

No pedido, o partido alega que o Regime Especial de Fiscalização (REF) para contribuintes considerados devedores contumazes, instituído pela Lei nº 13.711, de 2011, e regulamentada pelo Decreto nº 48.494, de 2011, viola os princípios constitucionais da liberdade de trabalho e comércio, impondo sanções desproporcionais.

Há na lei, segundo o PSL, medidas que implicam exposição pública negativa do nome da empresa no mercado, além da inclusão dela em cadastro de restrição de crédito. São previstas também restrições operacionais e financeiras, como a perda de regimes especiais de pagamento do ICMS, a exigência de pagamento do imposto no momento da ocorrência do fato gerador, a suspensão do diferimento do imposto e a exigência de informações econômicas periódicas da empresa.

A norma estabelece ainda que as notas fiscais emitidas contenham a frase “contribuinte submetido a REF com vencimento do ICMS no fato gerador”. Além disso, só permite crédito fiscal mediante comprovante de arrecadação. De acordo com a ação judicial, o Estado do Rio Grande do Sul também tem realizado o envio de mensagens eletrônicas e feito ligações telefônicas para fornecedores e clientes das empresas devedoras do ICMS informando sobre essa situação de inadimplência.

Em sua defesa, o Estado alegou que os contribuintes incluídos no REF representam 0,5% dos contribuintes devedores. Isso evidenciaria a excepcionalidade da medida, reservada a casos graves e crônicos de inadimplência, quando todas as formas ordinárias e amigáveis de regularização já teriam sido tentadas sem sucesso.

A maioria dos ministros seguiu o voto de Nunes Marques. “Se por um lado o excesso de exação pode inviabilizar ou dificultar a atividade econômica, por outro a inadimplência contumaz desequilibra artificial e ilicitamente as condições de livre concorrência, porquanto a tributação constitui custo de qualquer negócio”, afirmou o relator.

Ainda de acordo com ele, segundo a jurisprudência do Supremo, não constitui sanção política a submissão de contribuinte a regime fiscal diferenciado em virtude de inadimplemento reiterado. “Não há qualquer argumento do requerente que demonstre serem desarrazoados os parâmetros estabelecidos no REF; tampouco é possível inferir, em abstrato, interferência direta no exercício de atividade profissional”, diz o ministro.

No plano federal, não existe norma que estabeleça critérios uniformes para definir quando um contribuinte deve ser considerado devedor contumaz, segundo Anderson Mainates, advogado associado do Cascione na área tributária. Também não há norma que defina qual procedimento deve ser adotado ou quais as consequências dessa classificação pelo Fisco.

Para o tributarista, mais grave do que validar a divulgação dos nomes dos devedores contumazes, é o condicionamento da apropriação de créditos à comprovação do recolhimento do imposto e a possibilidade de revogação de regimes especiais.

Mainates destaca que tanto o STF quanto o Superior Tribunal de Justiça (STJ) já enfrentaram o tema sob a ótica criminal, fixando como parâmetro comum, a necessidade de verificação de dolo ou intenção de apropriação dos valores não recolhidos ao Fisco (RHC 163.334 no STJ e HC 760.150 no STF).

O especialista lembra que tramita na Câmara o Projeto de Lei nº 15, de 2024, que busca suprir essa lacuna normativa. O projeto dedica um capítulo à definição de critérios para caracterização do devedor contumaz, assegurando contraditório e ampla defesa mediante processo administrativo específico. “Essa uniformização é relevante porque, hoje, cada Estado adota seus próprios parâmetros”, afirmou.

O PL 15 foi enviado pelo Ministério da Fazenda à Câmara dos Deputados. Ele institui programas de conformidade tributária e aduaneira no âmbito da Receita Federal, do Ministério da Fazenda e dispõe sobre o devedor contumaz e as condições para fruição de benefícios fiscais.

Existem outros projetos sobre o tema. No Senado, tramita o PLP nº 164, de 2022. O texto busca criar uma norma geral para uniformizar critérios e procedimentos em todo o país, evitando distorções entre os Estados.

Na esfera estadual, as normas também são diferentes. Em São Paulo, por exemplo, a Lei Complementar nº 1.320, de 2018, considera devedor contumaz quem tiver débitos declarados e não pagos relativos a seis períodos de apuração (consecutivos ou não) em 12 meses. Já no Rio Grande do Sul, a classificação depende de débitos declarados e não pagos em mais de oito períodos, ou que ultrapassem 30% do patrimônio líquido, ou ainda 25% do faturamento anual declarado ao Fisco.

O voto do relator foi acompanhado pelos ministros Cristiano Zanin, Flávio Dino, Dias Toffoli, Edson Fachin, Gilmar Mendes, Luiz Fux, André Mendonça, Luís Barroso e Alexandre de Moraes.

Fonte: Valor Econômico