Impasse entre Bacellar e Castro trava pacote de 12 projetos do governo na Alerj
Enviado Quarta, 27 de Agosto de 2025.Segundo o Regimento Interno, a Casa tem cinco dias úteis a partir do recebimento de propostas para publicar os textos em D.O. Agora, as regras preveem até 45 dias para a votação
Enviado há quase duas semanas pelo governador Cláudio Castro (PL), o pacote de 12 projetos considerados prioritários para reforçar as receitas estaduais e endurecer o combate à criminalidade segue sem qualquer movimentação na Assembleia Legislativa do Rio (Alerj). As propostas estão paradas na mesa da presidência da Casa, comandada por Rodrigo Bacellar (União), em meio a uma disputa política que tem como pano de fundo as eleições de 2026.
A relação entre o governador e o presidente da Alerj azedou após a demissão do então secretário de transportes, Washington Reis, por Bacellar enquanto Castro estava em viagem. A crise intensificou-se e ganhou mais corpo em agosto de 2025, quando Castro admitiu não poder mais garantir a manutenção do vice-governador, que seria Bacellar, e, por sua vez, o presidente da Casa começou a apresentar projetos à Alerj sem o aval do governador.
O conflito mais recente que deixou Palácio Guanabara e Tiradentes aconteceu depois da circulação de um vídeo, no sábado, que o secretário estadual de Infraestrutura e Obras, Uruan Andrade — aliado histórico de Castro — apareceu ao lado do prefeito campista Wladimir Garotinho (PP), adversário político de Bacellar, trocando afagos. A gravação, postada pelo próprio prefeito com tom amistoso, foi vista no Legislativo como um recado direto ao presidente da Casa, que tem mantido clima de tensão com o governo.
— A política é dinâmica, e o poder de agenda é exclusivo da presidência. Estamos aguardando a reunião de líderes para ver a prioridade dessas discussões — afirmou um deputado próximo a Bacellar
O presidente da Alerj já havia decidido levar aos limites a tramitação dos projetos de Castro. Segundo o Regimento Interno, a Casa tem cinco dias úteis a partir do recebimento de propostas para publicar os textos em D.O. Agora, as regras preveem até 45 dias para a votação, em regime de urgência, no plenário.
Reunião de líderes à vista
Segundo parlamentares, Bacellar convocou para esta semana um encontro com líderes partidários para definir os próximos passos. Até lá, nenhuma das propostas do Executivo entrará na pauta. Nos bastidores, deputados avaliam que Bacellar tenta mostrar força interna, ainda que crie um ambiente de ameaça dentro da Casa. Deputados da base do presidente anseiam por uma possível ligação de Bacellar ao governador.
Na semana retrasada, o presidente endureceu o discurso e chegou a ameaçar substituir parlamentares que não comparecem às comissões. Durante sessão plenária, afirmou que “neste semestre vamos começar a ser implacáveis” e criticou a falta de produtividade dos colegiados.
— Quem não quiser, que tenha a hombridade de encaminhar ofício se auto destituindo. A produção da Casa não irá ser paralisada por conta disso — disse Bacellar em plenário.
Pacote paralisado
O envio dos 12 projetos foi feito em 11 de agosto. Entre os itens, estão a proibição de visitas íntimas a detentos, a contratação de policiais militares e bombeiros da reserva, mudanças na legislação das polícias Civil e Militar, a criação do Plano Estratégico da Região Metropolitana e um programa de refinanciamento de dívidas para empresas. Também constam a autorização para venda de 47 imóveis do estado e o uso de royalties do petróleo para pagamento de dívidas.
Apesar da urgência alegada pelo governo, nenhum dos textos chegou sequer a ser distribuído para análise das comissões.
Nos bastidores, a base de Castro foi orientada a não se manifestar sobre o impasse e a colocar panos quentes na crise, numa tentativa de preservar a imagem do governador, que planeja disputar uma cadeira no Senado em 2026. Já a base de Bacellar teme retaliações e vê no endurecimento do presidente da Casa uma política de “toma lá, dá cá” desde o rompimento com o Executivo. O clima entre os deputados é de medo.
Em nota, o Executivo buscou afastar a interpretação de crise política e enfatizou que é "importante ressaltar que são projetos para o Rio de Janeiro, independentemente de posicionamento político, e que as propostas já vinham sendo discutidas com a Casa antes do envio pelo Executivo. Assim, o Governo do Estado reitera o trabalho que vem fazendo junto ao Legislativo nesta gestão, sempre com muito diálogo, respeito à independência entre os Poderes e prezando pelo bem-estar da população.”
A lista de propostas:
1- Videomonitoramento de áreas públicas do estado
O governador Cláudio Castro pede à Alerj em regime de urgência a autorização para instalar câmeras de segurança e outras tecnologias de videomonitoramento em locais públicos, sinais de trânsito e marquises, independentemente de licenciamento ou autorização prévia. Os recursos para o projeto viriam de fontes como o Fundo Estadual de Investimento em Segurança Pública, transferências da União, doações, parcerias e convênios com municípios.
2 - Proibição total de visitas íntimas para detentos
A proposta é proibir qualquer tipo de visita íntima aos presos. Na justificativa do projeto, Castro alega que “a satisfação da lascívia não pode ser confundida com o exercício da garantia do direito da pessoa humana’’, já que o direito dos presos a vistas de familiares será mantida. O argumento é que essas visitas, feitas em locais sem controle de câmeras, vêm sendo usadas pelas facções para a troca de informações entre os presos e criminosos que estão em liberdade.
3 - Autorização para saída temporária ou para trabalhar
O direito dos presos para a saída do sistema penitenciário, seja para trabalhar ou em ocasiões especiais como o Natal, será mantido já que este é um benefício que está previsto pela Lei de Execuções Penais. Mas o projeto estabelece que a avaliação para conceder esse direito terá que levar em conta se o detento, ao entrar no sistema para cumprir a pena, declarou pertencer a alguma facção criminosa.
4 - Contratação de PMs e bombeiros da reserva
Permite ao estado contratar agentes reformados, por prazo determinado, no sistema chamado Prestação de Serviço por Tempo Certo (PTTC) pelo prazo de até nove anos. Os PMs não participariam de operações ou policiamento ostensivo. A ideia e que atuem no lugar de efetivos que hoje trabalham em funções administrativas ou atuem como instrutores nos quartéis
5 - Uso dos royalties do petróleo para pagar dívidas
O governador pede, em regime de urgência, autorização para usar recursos dos royalties do petróleo para pagar a dívida pública do estado com a União. Hoje, os royalties são usados para financiar a previdência dos servidores do estado. Os recursos, porém, só seriam empregados na hipótese de não haver déficit no Rioprevidência. O valor total autorizado se limitaria aos repasses realizados pelo tesouro à previdência nos últimos dez anos.
6 - Redução de juros e créditos de precatório para pagar dívidas
Castro apresentou uma proposta de um novo Refis, programa de refinanciamento de créditos tributários de ICMs e outros tributos, inscritos ou não em Dívida Ativa. O governo propõe perdoar até 95% dos juros e encargos em atraso, desde que o pagamento seja efetivado à vista. Há ainda possibilidade de parcelar a dívida, com descontos variáveis conforme o valor de entrada. Está previsto ainda um acerto de contas com os devedores, oferecendo precatórios para abater o saldo a pagar, prevendo descontos sobre as multas, e encargos que variam conforme o tributo.
A expectativa é que isso represente um incremento de receitas entre R$ 2 bilhões e R$ 3 bilhões. O advogado especializado em Direito Tributário, David Nigri, diz que há vantagens para o governo, que tenta incrementar a arrecadação e reduzir seu nível de endividamento tendo menos gastos para quitar precatórios. No caso dos contribuintes, esta será uma a oportunidade de saldar os débitos com descontos. Há pelo menos dez anos o estado não tinha um programa do gênero. A regra vale para tributos lançados até 28 de fevereiro de 2025. Essas receitas poderiam ser usadas, por exemplo, para saldar parte da entrada para o governo do estado aderir ao Programa de Pleno Pagamento de Dívidas dos Estados (Propag), cujas regras de adesão ainda aguardam análise de vetos pelo Congresso Nacional.
7 - Redução gradual de benefícios de incentivos fiscais
O projeto reduz progressivamente os percentuais de benefícios fiscais concedidos às empresas. Isso se dará com o repasse obrigatório desses recursos para um Fundo Orçamentário Temporário (FOT), que hoje já fica em média com 10% do benefício. Para 2026, essa retenção chegará a 30%. Os cortes continuarão nos anos seguintes até serem serem integralmente extintos em 31 de dezembro de 2032. O prazo de 2032 segue uma exigência aprovada pela Reforma Tributária para acabar com a guerra fiscal entre os estados. Meta do projeto é gerar R$ 800 milhões para o caixa do governo do estado este ano.
8 - Venda de imóveis sem uso ou que são subutilizados
O governador pede autorização para para vender 47 imóveis, sendo quatro em Niterói, um em Maricá e os demais na cidade do Rio de Janeiro, que podem gerar R$ 1 bilhão para o caixa. Dessa lista, porém, 11 já constavam de outra proposta enviada à Alerj em 2022, entre os quais uma área na Avenida Bartolomeu Mitre que foi ocupada pelo 23º BPM (Leblon). Entre as novidades, está a previsão de se desfazer de terrenos na Ilha da Pombeba, na Barra Olímpica. Há ainda a intenção de vender lojas e terreno na Rua Humberto de Campos 315, no Leblon. Outro imóvel é uma loja no Mercado das Flores, no Centro do Rio. Há ainda um imóvel na Rua Uruguai, 62, no Andaraí.
9 - Atualiza a legislação que trata da carreira da Polícia Militar
Projeto faz alterações na legislação estadual que trata dos efetivos da Polícia Militar para adequar a corporação às regras previstas Lei Orgânica Nacional das Polícias Militares e do Corpo de Bombeiros (Lei Complementar 14.571\2023).
10 - Muda lei da Polícia Civil para adequá-la a regras nacionais
Cria o cargo de oficial da Polícia Civil, que prevê a unificação de três cargos existente hoje: oficial de cartório de policia, investigador e inspetor de polícia, seguindo nomenclatura da Lei Orgânica Nacional das Polícias Civis.
11 - Promove a reestruturação da carreira da Policia Civil
Projeto atualiza legislação de 2010 que trata das das atribuições de cada cargo da Policia Civil. Prevê ainda o redimensionamento dos efetivos, incluindo regras para o atendimento remoto e pela central telefônica 197.
12 - Cria o Plano Estratégico da Região Metropolitana
Projeto estabelece um instrumento que define um plano a ser seguido pelos municípios da Região Metropolitana na definição de políticas públicas. São 55 propostas divididas em três temas: Metrópole Sustentável, Baía Reinventada e Governar a Metrópole. Uma delas prevê criar um órgão para coordenar o transporte público na região. Há ainda propostas para a extensão da rede metroviária da região.
Fonte: Extra