Ministério Público aponta confissão de fiscal sobre fraude do ICMS em carta escrita para
Enviado Quinta, 21 de Agosto de 2025.Artur Gomes da Silva Neto é apontado como a figura-chave na rede de corrupção e lavagem de dinheiro na Secretaria da Fazenda do Estado de São Paulo
Investigadores do Ministério Público tratam uma carta manuscrita, supostamente redigida pelo auditor fiscal Artur Gomes da Silva Neto, da Secretaria da Fazenda de São Paulo, como uma confissão de envolvimento em um esquema de propinas estimado em mais de R$ 1 bilhão. O documento foi localizado na residência do servidor e reforçou a decisão da Justiça de decretar sua prisão preventiva, na noite desta terça-feira. Para os promotores, o conteúdo do material se tornou uma das principais evidências reunidas contra o auditor.
Segundo apurou o EXTRA, para o Ministério Público, a carta reforçou a materialidade do crime, que já estava bem comprovada pela troca de e-mails do auditor com grandes varejistas envolvidas no esquema. Os promotores avaliaram que o material é “uma prova a mais” para somar entre as centenas de documentos que embasaram o pedido de prisão preventiva.
Datado de 3 de março, o documento tem três páginas escritas à mão, em caneta vermelha. No texto, o auditor manifesta insegurança sobre assinar documentos relacionados a “novas liberações de imposto” e pede orientação espiritual:
“Da outra vez eu perguntei para os guias do seu pai. Eles disseram que eu podia assinar, podia trabalhar com esse empresário. E deu esse problema imenso. Não posso mais fazer outro trabalho aqui e depois correr risco e ter que fazer trabalho espiritual de novo”, escreveu.
O documento foi encontrado durante a Operação Ícaro, que também resultou na prisão de executivos como Sidney Oliveira, dono da Ultrafarma, e Mário Otávio Gomes, diretor estatutário da Fast Shop. As empresas são suspeitas de pagar propinas para agilizar pedidos milionários de ressarcimento de créditos de ICMS-ST.
O auditor fiscal emergiu como figura central da estrutura criminosa que envolvia corrupção passiva, corrupção ativa e lavagem de dinheiro. A partir do crescimento "absurdo" do patrimônio da professora de 73 anos, o MP identificou um mecanismo estruturado para favorecer empresas do setor varejista em troca de vantagens tributárias indevidas.
Em 2021, a declaração de Imposto de Renda de Kimio registrava R$ 411 mil. No ano seguinte, o valor subiu para R$ 46 milhões. Em 2023, chegou a R$ 2 bilhões. No documento encontrado pelo MP, o auditor revela receio e busca algum tipo de garantia de que suas ações não serão descobertas. “Preciso ter certeza de que ninguém vai ver esses novos documentos que eu vou assinar”, registrou.
Para os promotores, o documento não apenas confirma a participação do auditor no esquema, mas também revela a intenção de manter sigilo para viabilizar a continuidade das operações ilegais. Na decisão, o juiz concordou com a argumentação do MP, afirmando que a carta "demonstra e confirma o esquema criminoso operado por Artur".
A decisão judicial obtida pelo EXTRA ainda ressalta a necessidade da prisão preventiva para "assegurar a aplicação da lei penal, à vista da periculosidade do agente, a partir da inequívoca gravidade dos crimes a ele imputados". O esquema é descrito como "sofisticado e ousado", envolvendo "grandes empresas e agentes públicos".
Além da carta, foram apreendidos documentos, celulares e computadores, que estão sendo periciados. A decisão sobre a prisão preventiva caberá ao juiz Paulo Fernando Deroma de Mello, da 1.ª Vara de Crimes Tributários, Organização Criminosa e Lavagem de São Paulo, responsável por autorizar a Operação Ícaro.
As investigações começaram após a constatação de uma evolução patrimonial inusitada da mãe de Silva Neto. Na sequência, uma análise de dados revelou que nos últimos anos o auditor realizou inúmeras viagens para países considerados paraísos fiscais, como Suíça, Emirados Árabes Unidos e Uruguai, o que reforçou as suspeitas de ocultação de ativos ilícitos.
Segundo documentos do MP, a mãe do auditor, identificada como Kimio Mizukami da Silva, era sócia de uma empresa chamada Smart Tax, que teria sido usada para a lavagem do dinheiro recebido das empresas.
Em 2021, o patrimônio declarado pela empresa de “prestação de serviços especializados em consultoria, assessoria e auditoria tributária” foi de R$ 411 mil. Em 2023, o patrimônio subiu para R$ 2 bilhões.
“Os dados fiscais enviados pela Receita Federal, com a quebra de sigilo da mãe, permitiram constatar evolução patrimonial absurda, em decorrência de rendimentos advindos da empresa Smart Tax”, diz o MP nos autos.
Fonte: Extra