Embate entre Castro e Bacellar ameaça plano do Rio de levantar R$ 37 bilhões e zerar juros da dívida
Enviado Sexta, 15 de Agosto de 2025.Estado corre atrás de recursos para tentar conseguir a entrada de 20% do montante devido para obter juros zero nas prestações através do Programa de Pleno Pagamento de Dívidas dos Estados (Propag)
O pacote de 12 projetos apresentados pelo Governo do Rio à Assembleia Legislativa (Alerj) esta semana vai além de tentar reduzir o desequilíbrio das contas públicas e de melhorar a segurança no estado. Várias das medidas têm outro alvo importante: correr atrás de parte dos 20% (cerca de R$ 37 bilhões) da dívida fluminense com a União, necessários para dar de entrada e aderir ao Programa de Pleno Pagamento de Dívidas dos Estados (Propag), com juros zero e pagamento das parcelas apenas com correção monetária, ao longo de 30 anos.
Para o professor da Faculdade de Ciências Econômicas da Uerj, Bruno Sobral, o pacote só foi encaminhado à Alerj por causa do Propag. Ele lembra que, para conseguir recursos, o Rio conta com a derrubada, pelo Congresso Nacional, do veto presidencial ao artigo da Lei Complementar 212/2025 (cria o programa) que prevê a amortização da divida com o uso de valores a receber, nos próximos anos, do Fundo Nacional de Desenvolvimento Regional (FNDR), instituído pela Reforma Tributária.
Além da derrubada do veto não ser certa, o dinheiro a ser obtido não seria suficiente para alcançar os 20% de entrada, acrescenta o professor:
— Há todo um desafio para chegar a um volume suficiente de economia de recursos para conseguir dar conta de chegar aos 20%. Estão correndo atrás de juntar dinheiro, tirando um pedacinho daqui e outro dali, para ver se conseguem o suficiente. Essa é a entrada ideal. A segunda opção é pagar 10%, e os juros serem de 1% ao ano. Se não conseguir amortizar nada, terá que desembolsar 2% de juros da dívida ao ano.
Segundo o Senado Federal, não há data para os vetos à lei do Propag serem apreciados pelo plenário conjunto (Câmara e Senado). Para a derrubada, é necessária a aprovação da maioria absoluta de cada uma das Casas Legislativas, ou seja, 41 votos a favor dos 80 senadores e 257 dos 513 deputados federais.
De acordo com a Secretaria estadual de Fazenda, a dívida total do estado chega a R$ 217 bilhões (valores de junho). Desse montante, R$ 185 bilhões são devidos diretamente à União, R$ 29 bilhões relativos a empréstimos que têm o aval do governo federal e R$ 3 bilhões referentes a parcelamentos. A proposta fluminense é aportar uma entrada de 20% do saldo da dívida direta com a União, o equivalente a R$ 37 bilhões.
Três projetos: receita estimada de R$ 4,8 bilhões
As propostas do estado poderão enfrentar um obstáculo eleitoral: o presidente da Alerj, Rodrigo Bacellar (União), ex-aliado de quem o governador Cláudio Castro vem se afastando nas últimas semanas. Em três dos 12 projetos, o governo cita estimativa de receita, que soma cerca de R$ 4,8 bilhões.
Um deles, que o estado não informa valores, é voltado para o uso do dinheiro de royalties de petróleo e participação especial no abatimento da dívida, o que é permitido pela lei do Propag. Bruno Sobral ressalta que a proposta é polêmica, embora seja a forma mais fácil de conseguir um montante considerável:
— O projeto é polêmico porque permite usar o é usado recursos do fundo de previdência dos servidores do estado. Pode criar um problema para frente. Não adianta tapar buraco num lugar, criando buraco no outro. Não recomendaria.
Com outra iniciativa, que cria um novo Refis — programa de refinanciamento de créditos tributários de ICMs e outros tributos, inscritos ou não em Dívida Ativa —, o estado espera arrecadar entre R$ 2 bilhões e R$ 3 bilhões. Neste caso, o professor da Uerj entende que, em vez de dar desconto para receber valores devidos, o melhor seria inventariar “os débitos considerados saudáveis” e transferi-los ao governo federal, como previsto no Propag:
— Como não haveria o desconto do Refis, os valores seriam maiores.
Já com a venda de 47 dos seus 3.500 imóveis, objeto de outra iniciativa, o estado prevê arrecadar perto de R$ 1 bilhão. Neste caso, Sobral também acha melhor que os montantes desse patrimônio sejam contabilizados e usados para abater a dívida com a União.
Mais R$ 800 milhões o governo pretende conseguir com a redução progressiva dos percentuais de benefícios fiscais concedidos às empresas. Isso se dará com o repasse obrigatório desses recursos para um Fundo Orçamentário Temporário (FOT), que hoje fica em média com 10% do benefício. Para 2026, essa retenção chegará a 30%.
Plano Estratégico: contrapartida
Outro projeto que, segundo Sobral, vai ao encontro do Propag é o que define um Plano Estratégico a ser seguido pelos municípios da Região Metropolitana na definição de políticas públicas. Isso porque, em contrapartida aos esses benefícios do Propag, os estados que aderirem ao programa deverão aplicar parte dos valores que deixarão de pagar em juros em investimentos em áreas prioritárias, como educação e segurança pública, com benefícios direto à população.
— Já existe um plano de desenvolvimento econômico e social, o Pedes. Outras medidas têm que estar associadas a ele, ajudando a dar mais detalhamento ao Pedes — afirma o economista.
Por e-mail, o governo diz que enviou à Alerj propostas “com o objetivo de atualizar e aperfeiçoar a legislação estadual, contribuindo para intensificar o combate ao crime, a valorização das forças policiais e o reforço de caixa”. Sem polemizar com o Legislativo, “destaca o papel fundamental que a Casa tem desempenhado, em parceria com o Executivo, garantindo cada vez mais políticas públicas para o estado".
Fonte: O Globo