A (i)lógica do imposto sobre imposto na reforma tributária
Enviado Sexta, 08 de Agosto de 2025.A lógica e a interpretação da reforma refutam a inclusão de IBS/CBS na base de ICMS e ISS
No iniciante processo de preparação para a reforma tributária, cujo prazo de transição inicia em menos de cinco meses, as empresas estão se deparando com questões práticas que demandam tomada de decisão. Dessas questões, neste texto, pretendo jogar luzes a uma específica: a formação de preço e a ordem de incidência dos tributos antigos (ICMS e ISS) e dos tributos novos (IBS e CBS). De uma maneira teórica, já tratei desse assunto anteriormente, mas ele merece ser retomado, agora, com uma abordagem mais prática, de maneira aplicada.
De início, permitam-me as leitoras e os leitores explicar a ausência de referência a PIS/COFINS: praticamente, não haverá concomitância entre essas contribuições e os novos tributos. De acordo com o cronograma da transição, em 2026, ainda teremos PIS/COFINS, mas o controle de IBS e CBS será exclusivamente para fins estatísticos. Em 2028, já não teremos mais PIS/COFINS e a transição efetiva do IBS começa em 2029 – de 2026 a 2028 serão alíquotas estatísticas. Apenas em 2027 haverá concomitância da CBS com PIS/COFINS, e mesmo assim ainda sem a alíquota de referência efetiva.
Com isso, nossa “preocupação” se restinge à eventual inclusão dos valores de IBS e de CBS na base de cálculo de ISS e ICMS – o que não é pouco. No caso do ISS, por um lado, a alíquota é relativamente baixa (no máximo de 5%), porém, ele é um imposto cumulativio. De outro lado, o ICMS é tributo não cumulativo, o que implica dizer que eventual montante superior será tomado como crédito do adquirente – naquilo que a legislação permite – e possui alíquota relativamente alta (de 17% a 22%).
Diante disso, como calcular o valor dos tributos constantes na nota fiscal? (a última etapa na formação do preço de bens, serviços e direitos).
Os atuais tributos sobre o consumo ICMS e ISS não compõem a base de cálculo de IBS e CBS, por expressa previsão legal: artigo 12, § 2°, V da Lei Complementar n° 214. No entanto, tanto ICMS quanto ISS são e continuarão a ser incluídos na própria base de cálculo (os chamados tributos “por dentro”).
Dessa maneira, em primeiro lugar, para a formação do preço na nota fiscal, será incorporado o tributo sobre o consumo atual correspondente: ICMS ou ISS, conforme o caso. Em seguida, calculam-se os tributos novos: IBS e CBS; as alíquotas destes últimos, no entanto, são aplicadas sobre o valor líquido de ICMS ou ISS, pois os tributos atuais não integram a base de cálculo dos novos tributos.
Incluir os valores de IBS e CBS na base de cálculo do ICMS ou do ISS, conforme o caso, contrariam a lógica dos novos tributos, que são adicionados na nota fiscal como última etapa da formação do seu valor.
Além disso, considerando que não há previsão legal de inclusão de IBS e CBS na base de ICMS ou ISS, não é possível adotarmos uma interpretação literal. Simplesmente porque não há letra da lei, não há literalidade da lei. Afastado método literal de interpretação, restar-nos-ia outros, dentre os quais destaco o método axiológico (valores, princípios) e teleológico (finalidade). Em ambos os casos, adotando a orientação que conduziu a reforma tributária, tanto nos seus valores (princípios) quanto na sua finalidade, refuta-se evidentemente o cálculo de tributo sobre tributo. Em consequência, afasta-se qualquer interpretação que tenha como corolário a inclusão de IBS e CBS na base de cálculo do ICMS ou do ISS (lembremos que a inclusão do ICMS na própria base de cálculo precisou de uma Emenda Constituição, a de número 33, de 2001, para evitar o contencioso a respeito do assunto).
Enfim: quer pela lógica quer pela interpretação, os valores de IBS e CBS não compõem a base de cálculo do ICMS ou do ISS, conforme o caso.
Fonte: Valor Econômico