‘Sonho’ de autonomia de empreendedores esbarra em custos e taxas

Enviado Quinta, 07 de Agosto de 2025.

Serviços administrativos e de documentação resistem, apesar da crescente digitalização

Há quase 870 mil salões de cabeleireiros ativos no país, segundo o “Mapa das Empresas”, publicado no fim de maio pelo Ministério do Empreendedorismo, um número só menor que comércio de roupas, com pouco mais de 1 milhão de empresas registradas.

Pela média deste ano, a cada salão fechado no país, outro se mantinha em funcionamento. Foram cerca de 63 mil registros novos, e quase 30 mil de saldo positivo.

Pode parecer um desempenho ruim, mas apenas três das dez atividades do ranking de 2025 tiveram números melhores: serviços de apoio administrativo (como secretária e assessor administrativo), entrega de malotes e outras atividades de transportes (como autônomos).

O segmento de serviços administrativos e preparação de documentos, mesmo em tempos de avanço acelerado do digital, resiste na vice-liderança do ranking do primeiro quadrimestre há três anos, e só saiu do “top cinco” em 2020, ano de pandemia, quando os escritórios fecharam temporariamente pelo país.

Ex-empregada de um hospital privado por dez anos, Franciele de Souza Leandro, 33 anos, foi dispensada em 2024, e logo depois, descobriu uma sala vaga ao lado do metrô Pavuna, no Rio. Franciele fez um curso de depilação por R$ 1,5 mil e abriu seu negócio naquele local, usando o dinheiro da rescisão, sem ter nenhum cliente. E buscou sócias na área para complementar os serviços. Ela diz que há regiões muito concorridas, mas que os preços subiram após a pandemia pela alta nos custos, e o repasse foi geral, então não há disputa tão aberta por mercado.

“Tem muita gente insatisfeita com o próprio emprego e pensa em mudar de vida, e tem gente também insatisfeita com o prestador de serviço que frequenta, então isso tudo acaba criando um cenário favorável para as pessoas abrirem seus negócios”, disse ela.

No caso de moda, os lojistas foram afetados pela invasão dos importados da Ásia, especialmente após a covid, que acelerou a venda on-line, segundo a Associação Brasileira do Varejo Têxtil (Abvtex). Shein, Shopee e AliExpress são plataformas cuja venda de moda é representativa. Essas importações entravam no país livres de impostos, por meio de uma brecha na legislação, que só acabou em agosto de 2024. “Agora, o mercado está vendo o efeito da desigualdade tributária que perdurou até metade do ano passado”, disse Edmundo Lima, diretor-executivo da Abvtex.

Desde agosto, compras internacionais de até US$ 50 passaram a ser taxadas em 20%, além do ICMS de 17%, para empresas registradas num programa federal. De janeiro a abril de 2021 e de 2022, comércio de roupas e acessórios era líder em número de empresas abertas, com 71,5 mil registros no período, em média. Neste ano, ficou em quarto lugar, com 62 mil, mostra o levantamento.

Embora o cenário se mostre animador para abertura de negócios, há questionamentos dos empreendedores. Na área de entregas, por exemplo, sites e “apps” acionam os entregadores já cadastrados para agendar o transporte, com volumes de pacotes e rotas pré-definidas, e preços são previamente acertados com base em tabelas. O Valor apurou que, por pacote, os sites pagam de R$ 2 a R$ 4 por entrega. Há grupos de discussão no YouTube em que os motoristas falam do tema.

“Tem que chegar no ponto [de coleta] às 5h da manhã, esperar na fila e organizar todos os pacotes, para conseguir sair carregado de lá às 10 horas”, diz um entregador num dos grupos. “Em média, eu pegava 90 pacotes por dia, o que dava umas 70 paradas. Então são 7 a 8 horas pra entregar tudo, para tirar R$ 120, descontando o combustível, me diz se compensa.” Outros motoristas rebatiam as críticas. “ É tudo questão de paciência e experiência. Recebo em média R$ 170 por rota, e o máximo de pacotes que já peguei foi 69 e o máximo de tempo que gastei foram seis horas.”

Fonte: Valor Econômico