Como a reforma tributária pode dar novo fôlego a sindicatos

Enviado Sexta, 06 de Junho de 2025.

Lei complementar pode dar sobrevida a agremiações que perderam receita com o fim de contribuição obrigatória

Privados de uma de suas principais fontes de financiamento desde a reforma trabalhista de 2017, a contribuição obrigatória, os sindicatos podem ganhar fôlego com a reforma tributária. A Lei Complementar 214/25 diz que empresas poderão aproveitar crédito tributário em benefícios como plano de saúde, vale-transporte e vale-refeição, desde que estejam previstos em acordo ou convenção coletiva de trabalho.

“Vai ser muito bom para nós”, disse o presidente da União Geral dos Trabalhadores (UGT), Ricardo Patah. A central tem em sua base trabalhadores do comércio. “Será uma força muito grande.”

Ele informou que, atualmente, supermercados com mais de 350 funcionários devem oferecer plano de saúde a seus empregados, por convenção coletiva. No geral, porém, o benefício não consta dos acordos coletivos, mesmo nas empresas que o fornecem.

Juvandia Moreira, vice-presidente nacional da CUT e presidente da Contraf afirmou que essa exigência não foi um pleito dos sindicatos, mas a considera importante porque a negociação faz com que o benefício seja válido para todos os trabalhadores e não apenas para alguns. “As empresas não podem usar como mecanismo de disfarçar salário, pagando só para uma parte”.

“Eles [os autores da lei] deixaram bem claro no texto que benefício de vale-transporte, vale-alimentação, vale-refeição, seguro-saúde, que normalmente é gigantesco o valor que se paga sobre isso, tudo isso aí depende de acordo coletivo ou de convenção coletiva firmada com os sindicatos”, afirmou o advogado Rubens de Souza Lopes, presidente do Grupo Executivo de Estudos da Reforma Tributária (Gert). “É uma rubrica gigantesca para prestadores de serviço e que, simplesmente, não vão poder tomar crédito se não tiver o acordo com o sindicato.” Dessa forma, avalia, as organizações sindicais ganham poder.

Na proposta original do governo, esses benefícios não davam direito a crédito tributário, porque são considerados bens de uso e consumo pessoal. “A empresa adquire esse benefício para repassar para o seu funcionário ali e vai ser o consumo final desse benefício mesmo”, explica Souza. É o mesmo tratamento dado aos “fringe benefits”, como a cessão de carros para diretores.

A possibilidade de creditamento e a exigência de haver acordo coletivo foram incluídos no texto pelo deputado Reginaldo Lopes (PT-MG), que relatou a proposta quanto esta retornou à Câmara após ser modificada no Senado.

“Nós amarramos que o benefício só pode ser fruto de creditamento quando consta do contrato coletivo de trabalho”, explicou. “Então, não tem perigo nenhum de ser [um benefício] só para a diretoria.” A fórmula “fortalece os acordos coletivos e melhora a saúde do trabalhador”, na sua visão.

“O crédito é relativamente pequeno, pois corresponde apenas ao IBS/CBS cobrado sobre a margem do plano de saúde, com alíquota reduzida”, comentou uma fonte do governo.

Segundo o tributarista Luca Salvoni, sócio do Cascione Advogados, a previsão de créditos para pagamentos de vale-refeição e vale-transporte enquanto não há no pagamento de salários gera um incentivo econômico indireto para o aumento da concessão de benefícios em detrimento do salário formal. Por isso, a obrigatoriedade de negociação com os sindicatos é uma consequência natural para evitar abusos e distribuição disfarçada de recursos, com a migração de parte do salário para benefícios, que vão gerar crédito.

“O sindicato entra como agente balizador desse valor”, afirmou o advogado. A exigência de negociação coletiva acaba sendo uma alternativa à fiscalização empresa a empresa, que seria inviável, segundo Salvoni.

Tadeu Henrique Machado Silva, sócio da área trabalhista do mesmo escritório, comentou que enquanto a reforma trabalhista de 2017 enfraqueceu os sindicatos, agora há uma possibilidade de eles ficarem mais fortes mesmo que essa não tenha sido a intenção da norma. “Mostra a força da negociação coletiva.”

Fonte: Valor Econômico