Pré-candidato ao governo do Rio, Paes abre mão de royalties do petróleo em favor de São Gonçalo, segundo maior colégio eleitoral do estado
Enviado Quarta, 16 de Abril de 2025.A discussão ocorre no momento em que o Supremo Tribunal Federal (STF) julga os últimos recursos contra a mudança dos critérios de distribuição
O prefeito Eduardo Paes reafirmou nesta terça-feira que está disposto a abrir mão de parte das receitas dos royalties de petróleo a que a capital tem direito em favor de São Gonçalo. Na oposição e até entre aliados do prefeito, o gesto é interpretado como uma agenda de Paes como pré-candidato ao governo do estado em 2026, pelo PSD. Com cerca de 900 mil moradores, São Gonçalo tem o segundo maior colégio do estado, atrás só da cidade do Rio.
A discussão ocorre no momento em que o Supremo Tribunal Federal (STF) julga os últimos recursos contra a mudança dos critérios de distribuição, uma discussão judicial iniciada há três anos. Além de São Gonçalo, as cidades de Guapimirim e Magé também são autoras da ação em que pedem mais verba do petróleo. Caso a tese dos três municípios saia vencedora, Rio, Niterói e Maricá poderiam perder R$ 1,5 bilhão por ano em royalties, quase 50% da arrecadação total.
‘‘Não é justo que municípios tão populosos e com tantas demandas fiquem nessa situação. O resto é fofoca de quem não sabe o que significa solidariedade metropolitana”, escreveu o prefeito do Rio no X.
Paes tratou do tema pelas redes sociais duas vezes nos últimos dias — antes disso, não havia falado publicamente sobre o assunto. Na primeira vez, apareceu ao lado do secretário municipal de Proteção e Defesa do Consumidor, Diego Pires, logo depois de o prefeito de Maricá, Washington Quaquá, também se dizer a favor da divisão das receitas com as três cidades. No processo, porém, a posição da prefeitura é contra a redivisão dos royalties.
Suplente de deputado estadual pelo PSD, Diego tem base eleitoral em São Gonçalo, onde já foi vereador. Já o PT de Quaquá tem interesse em uma eventual aliança com o PSD de Paes, com uma indicação do vice na chapa do prefeito do Rio.
Paes não antecipou o montante do qual estaria disposto a abrir mão. Já o prefeito de Maricá acena em dispor cerca de R$ 300 milhões — quase 10% do que a cidade recebe por ano.
Paes e Quaquá concordaram em discutir o assunto em uma audiência de conciliação ainda a ser agendada pelo presidente do STF, Luís Roberto Barroso. Por sua vez, o prefeito de Niterói, Rodrigo Neves, disse ser contrário a acordos por entender que abrir mão dessas receitas contraria a lei.
— A alternativa seria criar um fundo intermunicipal de desenvolvimento, para alocar recursos em projetos em áreas como Saúde, Educação e Transportes — defendeu Neves.
— A iniciativa é absurda e tem cunho eleitoral. O mesmo prefeito que diz estar disposto a abrir mão de receitas dos royalties pediu à Câmara autorização para se endividar ainda mais para fazer novos investimentos. Tentou R$ 6 bilhões, e a Casa autorizou R$ 2,2 bilhões. Não tem lógica — disse o líder do PL, Rogério Amorim.
Especialista em energia e primeiro diretor da Agência Nacional de Petróleo (ANP), David Zylbersztajn diz que qualquer eventual acordo no STF envolvendo os municípios não poderiam ser feito de forma unilateral.
— A ANP define os parâmetros para essa distribuição. As regras valem para o país inteiro. O que os prefeitos poderiam fazer é pedir aos legislativos municipais a autorização para doar recursos do orçamento, mas sem esse vínculo direto com royalties — disse.
O economista Mauro Osório destaca que a ANP faz os cálculos dos repasses para os estados e os municípios com base em duas leis federais que tratam sobre o tema. Por isso, qualquer revisão dos critérios teria que passar pelo Congresso Nacional.
— São Gonçalo tem a segunda maior população da Região Metropolitana do estado, mas proporcionalmente recebe menos royalties que outros municípios. Nesse ponto, isso poderia corrigir uma injustiça. Por outro lado, voltar a discutir esse tema no Congresso Nacional hoje poderia gerar perdas de receitas para o Rio, porque todos os estados vão reivindicar que os recursos sejam redivididos — explicou Osório.
A distribuição dos royalties toma como base a distância entre os municípios e os campos petrolíferos, e não sua população. A disputa entre as cidades fluminenses começou em 2022. Com base em mapas produzidos por consultores que contrariavam as demarcações oficiais do IBGE, São Gonçalo, Magé e Guapimirim conseguiram na 21ª Vara Federal Civil de Brasília uma liminar que previa uma redistribuição das verbas. Rio, Niterói e Maricá recorreram, e a decisão caiu no Superior Tribunal de Justiça (STJ). Acionado, o STF vem concordando com o STJ.
Na época, só a cidade de Niterói estimou que perderia R$ 1 bilhão por ano se a liminar fosse mantida. A Procuradoria do Município de São Gonçalo informou que aguarda a manifestação do STF sobre o processo e a realização da audiência. As prefeituras de Magé e Guapimirim não retornaram.
Fonte: O Globo