Proposta de reforma tributária permite que Estados e municípios alterem alíquotas de impostos

Enviado Sexta, 26 de Abril de 2024.

Se quiserem arrecadar mais ou menos, entes federativos podem propor alterações na cobrança a seus legislativos, diz Appy

Apesar e do Ministério da Fazenda estimar uma alíquota padrão de referência de 26,5%, sendo de 8,8% para a Contribuição sobre Bens e Serviços (CBS) e de 17,7% para o Imposto sobre Bens e Serviços (IBS), a União, os Estados e os municípios poderão fixar percentuais diferentes, caso aprovado em seus Legislativos.

“A alíquota de referência é adotada automaticamente para União, Estados e municípios. Se os entes quiserem arrecadar mais ou menos, eles podem na sua assembleia aprovar uma lei cobrando mais ou menos”, explicou o secretário extraordinário da Reforma Tributária, Bernard Appy, em entrevista coletiva nesta quinta-feira, 25, para detalhar os pontos do projeto de lei que regulamenta a reforma tributária do consumo, que cria a CBS, o IBS e o Imposto Seletivo, em substituição ao Pis/Cofins, ICMS, ISS e ao IPI.

Ele disse que a autorização é necessária para garantir o respeito ao pacto federativo e não retirar a autonomia dos entes. Para Appy, é “minúsculo” o risco de uma guerra fiscal entre os Estados e municípios, apesar dessa liberdade dada pela reforma tributária para os entes fixarem uma alíquota diferente da de referência.

“Poderia ter risco de um [Estado ou município] reduzir alíquota pra atrair o consumidor, só que eu não posso reduzir alíquota somente da televisão, tenho que reduzir de tudo [todos os bens e serviços], então vou perder arrecadação”, explicou o secretário. “Não vai gerar guerra fiscal, se houver algum risco, é minúsculo.”

Appy também destacou que a guerra fiscal entre os Estados que existe hoje ocorre devido à tributação ser na origem, ou seja, no local de produção. Com a mudança do fato gerador para o destino, essa guerra fiscal vai acabar.

Já o diretor de programa da Secretaria Extraordinária da Reforma Tributária, Daniel Loria, disse que a fixação das alíquotas terá relação direta com a política. “Os consumidores são os eleitores. Haverá uma relação direta da política e do fiscal. Se o governador quiser aumentar a alíquota, tudo bem, mas dialogue com a sua assembleia e com seus contribuintes”, afirmou o diretor.

A alíquota padrão de referência será fixada pelo Senado Federal, após definição de metodologia e cálculo pelo Comitê Gestor do IBS e pelo Poder Executivo, respeitando os parâmetros e prazos contidos no projeto de lei. O Tribunal de Contas da União (TCU) homologará todo o processo.

É essa alíquota que está sendo estimada em 26,5%, somando CBS e IBS, e a que deverá manter a carga tributária. Ela será revisada durante o período de transição e sempre que houver mudanças na legislação que comprometam a manutenção da carga tributária. Ou seja, quando forem incluídos bens e serviços com alíquota reduzida ou zerada.

Os técnicos da Secretaria Extraordinária da Reforma Tributária (Sert) também esclareceram que a alíquota padrão de referência estimada em 26,5% não considera exceções e regimes especiais. Incluindo esses dois casos, a alíquota média de referência fica menor. O número ainda não foi calculado, mas deve ser divulgado nas próximas semanas.

Appy também afirmou que, apesar de o futuro Imposto sobre Valor Agregado (IVA) ter uma das maiores alíquotas padrão do mundo, será menor do que a alíquota média paga hoje pelas empresas e consumidores.

“[As pessoas dizem que] é muito alta. A cobrança é por fora, vai ser sobre o preço do bem ou serviço. Hoje é por dentro, as pessoas não têm a menor ideia de quanto estão pagando. A nova alíquota será transparente, pessoas vão saber quanto estão pagando de imposto. Hoje, não temos uma alíquota padrão, mas estimamos [a soma de] ICMS e impostos federais em 34,4%, por fora”, rebateu o secretário.

Para o secretário-executivo do Ministério da Fazenda, Dario Durigan, a transparência da carga tributária será uma marca da reforma tributária. “Vamos passar a ter um dos melhores sistemas do mundo”, destacou. Appy endossou as declarações e disse que a regulamentação proposta pelo governo traz para o Brasil um Imposto sobre Valor Agragado (IVA) de padrão internacional.

“Vai tornar sistema mais justo, mais simples e mais eficiente. O efeito da reforma será positivo do ponto de vista distributivo e regional”, destacou. Os técnicos também reforçaram durante a entrevista que a reforma será neutra do ponto de vista fiscal - ou seja, não aumenta nem reduz a arrecadação.

Pelo lado da simplificação do novo regime tributário, o auditor da Receita Roni Petteron explicou que a intenção do governo é tornar o sistema de “split payment” obrigatório e admitiu que eventuais discussões sobre remuneração do serviço vão surgir durante a discussão no Congresso Nacional.

O “split payment” é o sistema de pagamentos para coibir fraudes. Ele prevê que os impostos criados pela reforma serão recolhidos já no momento do pagamento, quando o banco vai separar o valor para os cofres públicos dos entes nacionais. Isso ocorrerá com a intenção de combater a sonegação fiscal. O texto não prevê, hoje, nenhum modelo de remuneração pelo sistema.

Outra novidade da reforma tributária, segundo os técnicos da Fazenda, é uma redução “relevante” dos custos dos medicamentos e produtos ligados à saúde. Isso porque o projeto prevê uma lista com uma série de itens com alíquota zerada ou reduzida em 60%. “Haverá uma redução bastante relevante de custo dos medicamentos, não só pela ampliação da lista, mas também pela cumulatividade, que existe hoje e não terá mais”, destacou Appy.

O projeto também prevê a possibilidade de atualização anual ou emergencial da lista de medicamentos e dispositivos médicos com isenção ou alíquota reduzida por ato conjunto do Poder Executivo e do Comitê Gestor do IBS. É o chamado “fast track”, disse a diretora de programa da Secretaria Extraordinária da Reforma Tributária, Camilla Cavalcanti. A medida será importante em momentos emergenciais.

Em outra medida com potencial impacto sobre as finanças das famílias de menor renda, o projeto de lei prevê um “redutor social” de R$ 100 mil da base de cálculo do IBS e da CBS na venda de imóveis novos. “Estamos onerando os imóveis de alto padrão e reduzindo a carga sobre os imóveis do Minha Casa Minha Vida”, explicou Appy.

Isso porque sobre um imóvel novo de R$ 200 mil, por exemplo, será aplicado o redutor, e a tributação será aplicada apenas sobre a metade do valor. O “desconto” de R$ 100 mil é fixo, estabelecido no projeto de lei.

Os técnicos também defenderam o modelo da cesta básica nacional previsto no projeto, em meio a pressões para que a lista de itens com alíquota zero seja ampliada. Appy explicou que, se as proteínas animais tivessem isenção de impostos, por exemplo, a alíquota de referência subiria dos atuais 26,5% para 27,1%. No modelo sugerido pelo governo, as carnes ficaram com alíquota reduzida de 60%.

“Ao ficar na alíquota reduzida, já há diminuição na tributação da carne no Brasil em relação à situação atual”, afirmou o secretário extraordinário.

Idealizador da cesta básica nacional, o diretor de programa da Secretaria Extraordinária da Reforma Tributária, Rodrigo Orair, contou que três critérios foram escolhidos para definir o que faria parte das alíquotas reduzidas ou zeradas: alimentação saudável com base em critérios do Ministério da Saúde, alimentos mais consumidos pela população mais pobre e, por último, os itens da atual cesta básica. Hoje, destacou que apesar de alíquotas já serem menores para alguns alimentos, há uma “tributação invisível”, já que há tem cumulatividade.

Já o cashback - mecanismo de devolução dos tributos pagos a famílias com renda per capita de até meio salário mínimo inscritas no Cadastro Único - terá o potencial de beneficiar 28,8 milhões de famílias de baixa renda, sendo 73 milhões de pessoas, comentou Orair.

Fonte: Jornal Valor Econômico