Clã Brazão influenciou vários ramos da política fluminense

Enviado Terça, 26 de Março de 2024.

Efeito deve ser maior nas campanhas de Eduardo Paes e de Alexandre Ramagem

As prisões dos irmãos Domingos Brazão, conselheiro do Tribunal de Contas do Rio de Janeiro, e Chiquinho Brazão (sem partido-RJ), devem impactar as eleições municipais deste ano na cidade, conforme avaliam políticos fluminenses de diversas correntes ouvidos pelo Valor. O efeito pode ser mais sentido nas campanhas dos principais candidatos: o prefeito Eduardo Paes (PSD) e o deputado federal Alexandre Ramagem (PL). Os irmãos Brazão foram presos preventivamente no domingo (24), pela Polícia Federal, suspeitos de terem encomendado a morte da vereadora Marielle Franco (Psol), em março de 2018.

A família Brazão é considerada um dos clãs mais influentes da política estadual do Rio. Nas últimas décadas, esteve presente em palanques e governos de políticos de espectros até mesmo opostos, da esquerda à direita. Isso foi amplamente lembrado pelas redes sociais, após a prisão dos irmãos, com a divulgação de fotos e vídeos ao lado de políticos como Paes e o governador do Estado, Cláudio Castro (PL). Também viralizaram imagens dos irmãos Domingos e Chiquinho fazendo campanha para os ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) e Dilma Rousseff (PT).

As prisões foram determinadas pelo ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF). Junto com os irmãos, a PF também prendeu o ex-chefe da Polícia Civil Rivaldo Barbosa, suspeito de orientar como o crime deveria ser cometido e garantir aos Brazão a impunidade do caso. A PF aponta ainda que o clã também tem forte influência sobre grupos milicianos do Estado. Os irmãos negam acusação e envolvimento com o assassinato de Marielle. Barbosa rechaça os apontamentos da investigação.

Já na avaliação de líderes políticos, ouvidos sob condição de anonimato pela reportagem, a justificativa para a influência da família Brazão sobre a classe política fluminense se dá pela força eleitoral que eles têm na Zona Oeste do Rio, onde há a maior concentração de eleitores. Isso faz com que candidatos em pleitos tanto federais, quanto estaduais e municipais a procurem para ter acesso a essas regiões e, por consequência, partilhar da popularidade do clã.

Em contrapartida a esse acesso, segundo líderes políticos, os Brazão acabaram ganhando espaço em secretariados, fazem indicações a cargos públicos e recebem o apoio eleitoral de atores da política local.

Os vídeos, que circularam depois da prisão dos irmãos, mostram Paes e Castro ao lado de Domingos e Chiquinho. Nas imagens, o prefeito aparece defendendo a pré-candidatura de Kaio Brazão, filho do conselheiro, como pré-candidato a vereador no Rio este ano. Já o governador fez campanha para Chiquinho e seu irmão Pedro Brazão, deputado estadual, na eleição de 2022. “A minha querida família Brazão”, disse Castro na ocasião.

Procurados, Paes e Castro não responderam à reportagem até o fechamento desta edição.

Segundo interlocutores dos chefes do Executivo da capital e do Estado, a proximidade do prefeito e do governador com Domingos e Chiquinho - agora vistos como os supostos mandantes do assassinato de Marielle - pode afugentar eleitores. Em relação a Paes, o impacto seria em sua própria campanha à reeleição, dizem fontes.

Já Castro deve apoiar o deputado bolsonarista Ramagem. Um dos principais fiadores da campanha do parlamentar é o senador Flávio Bolsonaro (PL-RJ), que também aparece em imagens fazendo campanha ao lado da família Brazão. Ramagem não respondeu à reportagem.

Para Paes, afirmam fontes próximas, há o agravante de Chiquinho ter sido secretário de Ação Comunitária de outubro do ano passado até fevereiro de 2024. Embora o prefeito, desde as prisões, ainda não tenha se manifestado publicamente sobre o caso, a prefeitura mandou uma nota no domingo dizendo que indicação do deputado partiu de um partido aliado, o Republicanos, para onde Chiquinho pretendia migrar na janela partidária deste ano. O parlamentar acabou expulso do União Brasil, legenda à qual era filiado até ser preso.

“[A operação da PF] confirma o domínio do território não só físico mas também politico. É evidente que aqueles que se associaram ou associaram à sua gestão diretamente aos personagens têm o que dizer a sociedade”, disse ao Valor o líder do PL no Senado, Carlos Portinho, aliado do ex-presidente Bolsonaro. “O Rio é uma cidade que vive uma grave disputa de territórios. Chega de clãs e basta dos senhores feudais da politica. Não estamos em boas mãos, definitivamente”, disse.

Para redução de danos à imagem de Paes, uma aposta possível é evidenciar a denúncia contra Barbosa feita por seu secretário de Ordem Pública, Brenno Carnevale, que foi delegado na Delegacia de Homicídios entre 2016 e 2018. O depoimento de Carnevale foi usado pela Polícia Federal para apontar a conduta do ex-chefe da Polícia Civil na obstrução das investigações envolvendo o crime organizado.

Nesta segunda-feira (25), o secretário de Paes já começou a dar entrevistas sobre o caso, afirmando que denunciou Barbosa anos atrás: “Meu depoimento foi justamente para expor essa forma de tratar e negociar as investigações”, disse.

Entre políticos ouvidos pela reportagem, alguns apontam um postulante à prefeitura do Rio que tem capacidade de sair maior eleitoralmente após a operação da Polícia Federal: o deputado federal Tarcísio Motta (Psol-RJ), contemporâneo de Marielle na Câmara dos Vereadores. Essa avaliação foi dada tanto por correligionários do parlamentar quanto por políticos mais ao centro.

“O caso Marielle vai servir de chamamento para que os eleitores não votem mais em candidatos que tenham algum tipo de relação com o crime organizado. Quem passava pano para a criminalidade, deve parar. Não pode haver mais cumplicidade com os coronéis modernos”, afirmou o deputado federal Chico Alencar (Psol-RJ).

Fonte: Jornal Valor Econômico