Governadores sobem teto do ICMS para reaver perdas
Enviado Segunda, 30 de Janeiro de 2023.VALOR ECONÔMICO
O teto da alíquota do ICMS em 12 Estados brasileiros vai subir, entre março e abril, para compensar perda de receita com desoneração de combustíveis, energia e telecomunicações. Será elevada a alíquota geral de seis Estados da região Nordeste (Alagoas, Bahia, Maranhão, Piauí, Rio Grande do Norte e Sergipe), cinco na Norte (Acre, Amazonas, Pará, Roraima e Tocantins) e um na Sul (Paraná), segundo levantamento feito pela IOB, empresa de serviços tributários, contábeis e jurídicos. A medida pode ser um fator de pressão inflacionária neste ano.
Na sexta-feira, 26, os governadores se reuniram com o presidente Luiz Inácio Lula da Silva e colocaram como prioridade a necessidade de discutir a compensação de perdas de receita promovidas no último ano do governo Bolsonaro. A legislação passou a tratar combustíveis, eletricidade e transporte público como produtos e serviços essenciais, o que limitou a incidência do ICMS a cerca de 18% sobre eles. Alguns Estados cobravam mais de 30%. “A questão do ICMS é uma coisa que está na cabeça de vocês desde que foi aprovada pelo Congresso Nacional. E é uma coisa que nós vamos ter que discutir”, afirmou Lula aos governadores.
Apesar desse encontro, 12 Estados tinham se antecipado para aprovar, no fim do ano passado, projetos de lei que viabilizassem o aumento do teto da alíquota geral a partir de 90 dias, ou seja, entre março e abril. “Como o ICMS se sujeita ao princípio constitucional da anterioridade anual, caso algum outro Estado decida aumentar a alíquota geral em 2023, a medida só poderá entrar em vigor em 2024”, explicou a consultora tributária Renata Queiroz, da IOB. Nenhum Estado do Centro-Oeste e Sudeste aprovou leis para subir essa alíquota geral.
O secretário de Fazenda de Alagoas, George Santoro, ressaltou que o impacto do aumento das alíquotas na inflação é natural e que o governo federal foi alertado várias vezes sobre isso. O economista do Santander Felipe Kotinda já incorporou um aumento de 0,4 ponto percentual em sua estima de inflação - cenário para essa elevação considera que todos os Estados, exceto São Paulo, subiriam a alíquota modal - que vale como regra geral para cobrança do imposto - do ICMS para 22%.
“Vai impactar [a inflação] sim” comenta Santoro. “A taxa de inflação do país foi artificialmente baixada no ano passado pelas leis complementares 192 e 194. É natural e avisamos várias vezes que isso iria acontecer.” O Comsefaz [Comitê Nacional de Secretários de Fazenda, Finanças, Economia ou Tributação dos Estados e do Distrito Federal) fez vários alertas, ressaltou o secretário.
A lei complementar 192 prevê a cobrança do ICMS sobre os combustíveis incide apenas uma vez, de forma monofásica, e com alíquota única entre os Estados. Já a lei complementar 194 determinou a aplicação de alíquotas de ICMS pelo piso (17% ou 18%) para produtos e serviços essenciais como combustíveis, energia elétrica e serviços de comunicação.
“O aumento da modal do ICMS visou a recuperação parcial da carga tributária usurpada pelo governo federal no ano eleitoral de 2022, no meio do exercício financeiro, sem dar oportunidade aos Estados construírem um caminho fiscal sustentável”, diz Santoro. “Não compensa a perda imposta pela diminuição da carga tributária de energia, telecomunicações e combustível. Procuramos o setor produtivo para construir um caminho.” Segundo o secretário, o aumento da alíquota vai cobrir no máximo 70% da receita perdida e, por isso, a medida terá de ser associada com redução de despesas.
No caso do Maranhão, o gestor chefe da Assessoria de Desenvolvimento Institucional da Secretaria da Fazenda do Estado, Fernando Resende, explicou que a alíquota modal subirá de 18% para 20% para compensar a perda de 1/3 da receita do Estado devido a lei complementar 194. “Com esse impacto, o Estado do Maranhão enfrentou queda na sua expectativa de arrecadação tributária no valor de mais de R$ 2 bilhões no ano de 2022 e no exercício de 2023 poderia alcançar R$ 3,4 bilhões, se não fossem tomadas medidas compensatórias”, informou, lembrando que também foi vedado pela LC 194 a cobrança de adicional do ICMS de 2% para o Fundo Maranhense de Combate à Pobreza (FUMACOP), que incidia sobre combustíveis, energia elétrica e prestação de serviço de comunicação.
Além do aumento da alíquota modal, o Estado ainda instituiu a Taxa de Controle e Monitoramento Ambiental da Atividade de Transporte Ferroviário de Recursos Minerais e suspendeu, no período de 1º de janeiro de 2023 a 31 de dezembro de 2025, da concessão do benefício do diferimento do ICMS para usina produtora de pellets de minério de ferro e seus concentrados instalada no Maranhão. “O Estado entende que estas medidas reduzem em 60% as perdas. O restante deve ser compensado com a melhoria da fiscalização”, destaca.
A economista Juliana Damasceno, da Tendências Consultoria, lembra que, há muito tempo, existe um problema de desequilíbrio federativo porque Estados e municípios não têm capacidade arrecadatória, mas acumulam muitas obrigações para garantir a prestação de serviços à sociedade. Segundo ela, a arrecadação dos Estados começou a desacelerar em meados de 2022 e a perspectiva é de aumento de gasto com pessoal por conta de reajustes de servidores públicos. “A União está em uma situação difícil, com elevado déficit fiscal, e não deve ter disponibilidade para ressarcir os Estados. Houve esforço maciço dos Estados [aprovando aumento da alíquota do ICMS]. Por outro lado, perde o foco da reforma tributária”, destacou.
O pesquisador associado do Insper Marcos Mendes considera que não há como a receita perdida com a desoneração apenas ser compensada com corte de gastos. “Aumentar a alíquota do ICMS sobre outros produtos acaba distribuindo melhor a carga que estava muito concentrada em combustíveis, energia e telecomunicações. Por outro lado, a decisão de considerar bem essencial e limitar a tributação desses produtos me parece equivocada, uma restrição excessiva à política tributária”.
Fonte: Valor Econômico