Parecer da reforma tributária prevê penalidades às instituições financeiras que não cumprirem o ‘split payment’
Enviado Quarta, 17 de Setembro de 2025.Projeto deve ser votado nesta quarta-feira (17) na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) do Senado
Instituições financeiras que não cumprirem o ‘split payment’ poderão ser punidas, segundo o parecer substitutivo da segunda etapa da reforma tributária, apresentado pelo senador Eduardo Braga (MDB-AM) na última semana. As penalidades vão desde multas aplicadas por transação até a suspensão ou mesmo a cassação da autorização de funcionamento, em casos de prática reiterada. O projeto deve ser votado amanhã na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) do Senado.
O ‘split payment’ na reforma tributária é a retenção e repasse direto do valor dos tributos descritos na nota fiscal à Receita Federal no momento da liquidação financeira da operação.
As multas previstas no parecer para as instituições financeiras são de R$ 20 por cada transação sem segregação de tributos; multa de mora de 3% ao mês sobre tributos não recolhidos, pagos em atraso ou em valor menor; e multa de R$ 0,20 por transação, por dia ou fração, em caso de atraso ou erro na comunicação das informações sobre segregação e recolhimento.
Para Diego Perez, presidente da Associação Brasileira de Fintechs (ABFintechs), a previsão de punições é natural para que a medida seja efetiva, mas ainda existe a necessidade de detalhar a aplicação dessas penalidades, considerando as especificidades de cada tipo de arranjo de pagamento, para que não sejam “punitivas em excesso”.
“É natural que haja previsão de punições para quem não cumprir, senão vira uma medida sem aplicação prática. Nós não somos contra o estabelecimento dessas multas, o que a gente entende é que precisa ser melhor detalhado,” disse Perez, que está em Brasília para acompanhar a votação amanhã.
Na leitura de Luiz Eduardo Costa, sócio do Martinelli Advogados, essa multa seria uma espécie de “apoio moral” para as instituições financeiras que estariam atrasadas em relação ao ‘split payment’. “Essa penalidade é mais para reafirmar a necessidade do sistema. As instituições vão adaptar seus sistemas, mas vão ter um link direto com a Receita. Nosso sistema bancário é muito eficiente, e o nosso tributário também, falta uma ponte entre os dois”, afirma.
Para Carlos Crosara, advogado do escritório Natal & Manssur Advogados, a não adequação ao ‘split payment’ compromete a receita dos estados e municípios, e por isso o legislador “endureceu” as penalidades. “Já temos empresas que implementaram mudanças sistêmicas e estão prontas, mas outras ainda não começaram. Há risco de penalidades para quem perder o cronograma de adequação”, disse.
Já Marcel Alcades, sócio do Mattos Filho, vê a sanção mais como uma forma de se fazer cumprir a norma. “O relator [Eduardo Braga] fala que não existe norma sem sanção. Ou seja, se eu estabeleço uma obrigação, mas não estabeleço uma sanção, essa norma pode ficar sem aplicação na prática”, explica.
Embora a multa seja em um valor relativamente pequeno, Alcades avalia que em volume pode ter impacto para as instituições financeiras. “Quando você tem um erro sistêmico, a tendência é que tenha em várias transações, e isso se acumula. É uma penalidade que pode chegar a um valor muito alto para uma pessoa que sequer participa da relação tributária, mas está sendo responsabilizada pelo recolhimento.”
O parecer ainda define que a repetição dessas falhas configura violação às normas do sistema financeiro e de pagamentos. Nesses casos, além das multas, o órgão regulador poderá aplicar sanções como suspender temporariamente a autorização de operação ou até cassar o direito de funcionamento da instituição.
Será considerada prática reiterada quando o descumprimento das obrigações do ‘split payment’ atingir 10% ou mais da quantidade ou do valor total das transações em dois meses consecutivos ou alternados, dentro de um período de doze meses.
“Essa prática reiterada deve ser interpretada como aquela coisa de intencionalmente a empresa não fazer tudo que ela tem que fazer para corrigir o seu problema. Agora, se a empresa demonstra boa-fé, demonstra que está trabalhando, demonstra que houve um erro sistêmico etc., uma aplicação de penalidade dessa seria questionável”, diz Alcades.
A Associação Brasileira das Empresas de Cartões de Crédito e Serviços (Abecs) disse que está analisando e discutindo o tema. “O setor vem apoiando de forma firme as discussões lideradas pela SERT [Secretaria Extraordinária da Reforma Tributária] para implantação do split de forma isonômica por todos os arranjos de pagamentos”, afirmou em nota.
A expectativa é que a segunda etapa da reforma tributária seja aprovada ainda neste ano. Na avaliação dos advogados, sem que essa aprovação ocorra, é difícil avançar na agenda, que prevê o início da transição de sistema de tributação já no ano que vem.
Se aprovado pelo Senado, devido às alterações trazidas pelo substitutivo, o projeto deve retornar à Câmara dos Deputados — por onde já havia passado. Para Alcades, as penalidades devem ser um dos principais pontos de embate na nova rodada de debates legislativos. “A Câmara aprovou a lei complementar sem prever essas multas. Agora, é preciso ver se os deputados vão concordar em manter essa mudança.”
Segundo ele, a expectativa é de conclusão ainda este ano. “Sem essa lei, será muito difícil avançar na reforma tributária em 2026. Ela precisa ser aprovada em 2025”, afirmou.
“Há uma pressão enorme para aprovar o texto ainda este ano, porque sem o ‘split payment’ não há como a reforma tributária funcionar na prática”, acrescenta Crosara.
Fonte: Valor Econômico