Conselho Superior do Comitê Gestor do IBS e seus desafios

Enviado Quinta, 05 de Junho de 2025.

Estados e DF indicam representantes para o Comitê Gestor, novo protagonista da reforma tributária

O Conselho Superior do Comitê Gestor do Imposto sobre Bens e Serviços (CG-IBS) foi instaurado, por enquanto, apenas com a presença de representantes dos estados, que foram divulgados por meio do Diário Oficial recentemente. É importante nos atentarmos ao significado desse órgão e função a ser exercida por seus componentes.

Estamos diante de um órgão completamente novo em nossa República. No contexto das competências tributárias da nossa Federação, o CG-IBS funcionará de maneira peculiar na administração de um tributo de competência dos estados e municípios.

Peculiar porque a atuação dos entes federados ocorrerá de forma representativa. Ou seja, os estados, o Distrito Federal e os municípios não exercerão diretamente parte de suas competências tributárias, mas o farão por meio de representantes que integrarão esse Comitê Gestor. Dessa simples constatação, já se percebe o potencial de instabilidade inerente ao funcionamento desse comitê.

O ponto de atenção, ao se trabalhar por meio de um órgão representativo, é evidente: a atuação desses representantes está, invariavelmente, sujeita ao processo político. Em órgãos representativos, é natural o surgimento de jogos de interesse, formação de grupos de afinidade e defesa de interesses específicos. É justamente aí que está o perigo: o de o comitê se transformar em palco de disputas políticas.

No caso do Comitê Gestor, tal conclusão é ainda mais evidente diante dos cargos de seus representantes – no que se refere aos estados e ao Distrito Federal, os titulares dos cargos serão os secretários de Fazenda, e nos municípios, os secretários de Finanças ou cargos correspondentes.

Ora, por definição, os titulares de tais cargos são aqueles responsáveis por definir as políticas fiscais e tributárias dos entes federativos juntamente ao chefe maior do Executivo (prefeitos ou governadores). Também partindo apenas dessa afirmação, já se pode concluir o risco de tal órgão ser palco do exercício de intenções políticas por seus titulares.

Arrisca-se dizer que o sucesso do IVA, à brasileira, depende da forma de atuação desses representantes. Afinal, é o Comitê Gestor que detém a chave do cofre.

Essa jaboticaba incluída em nosso sistema federativo e de competências tributárias é ponto crucial para o sucesso do modelo. Por esse motivo, tanto a lista de representantes dos estados já divulgada, como todas as discussões havidas entre os municípios para descobrir quem ocupará esses cargos, tem um significado muito importante. São pessoas que darão a tônica inicial a esse comitê, aqueles deverão agir com cautela e espírito público para evitar que tal órgão se transforme em arena política onde cada ente defenderá interesses próprios.

Vale lembrar que, por ser o Comitê Gestor o detentor da chave do cofre, ele é também o guardião da própria manutenção do federalismo. Não há autonomia e independência dos entes federados sem autonomia financeira. Tampouco há autonomia dos entres federados se não houver voz ativa no órgão responsável pela gestão dos recursos necessários ao exercício das competências constitucionais a eles estabelecidas.

A Emenda Constitucional 132, a Lei Complementar 214 e o PLP 108 tratam o Comitê como órgão estritamente técnico. No entanto, basta analisar suas competências para concluir que o potencial de as decisões não serem estritamente técnicas é grande. Nesse sentido, vale listar as suas principais competências:

  • Editar regulamento único e uniformizar a interpretação e a aplicação da legislação do imposto;
  • Arrecadar o imposto, efetuar as compensações, realizar as retenções previstas na legislação específica e distribuir o produto da arrecadação aos estados, ao Distrito Federal e aos municípios;
  • Decidir o contencioso administrativo;
  • Atuar, juntamente com o Poder Executivo federal, com vistas a harmonizar normas, interpretações, obrigações acessórias e procedimentos relativos às regras comuns aplicáveis ao IBS e à Contribuição sobre Bens e Serviços (CBS);
  • Exercer a gestão compartilhada, em conjunto com a Secretaria Especial da Receita Federal do Brasil, do sistema de registro do início e do resultado das fiscalizações do IBS e da CBS;
  • Disciplinar a aplicação padronizada de regimes especiais de fiscalização;
  • Coordenar, com vistas à integração entre os entes federativos, no âmbito de suas competências, as atividades de fiscalização, cobrança judicial e inscrição em dívida ativa;
  • Coordenar, em âmbito administrativo e judicial, a adoção dos métodos de solução adequada de conflitos relacionados ao IBS entre os entes federativos e os sujeitos passivos;
  • Nos casos de conflitos entre dois ou mais entres federativos, disciplinar a forma de organização e gestão dos trabalhos, o rateio dos custos e a distribuição do produto da arrecadação;
  • Elaborar a metodologia e o cálculo da alíquota de referência e dos regimes específicos, junto com à Receita Federal.

A leitura da lista acima, além de demonstrar que não é exagero afirmar que o Comitê Gestor detém a chave do cofre, leva à conclusão de que tais providências contém um alto teor de subjetividade, envolvendo variáveis que podem favorecer determinados entes federados em detrimento de outros.

E não para por aí. A atual redação do texto proposto ainda garante ao Comitê Gestor competência para editar atos, como o regulamento único do IBS, e disciplinar o procedimento a ser adotado em caso de divergência acerca da interpretação, da apuração da base de cálculo ou do enquadramento dos fatos geradores.

A ampla competência normativa e interpretativa do Comitê Gestor, além de seu papel central como representantes dos interesses dos entes federativos, demonstra que não será tarefa fácil aos seus membros garantir que a atuação estritamente técnica prevaleça sobre a política. Em suma, a formação do Comitê Gestor marca o início de uma nova etapa para o federalismo brasileiro. Mais do que nomes, trata-se de escolhas que definirão o rumo de uma das mais importantes reformas institucionais do país. Que prevaleçam o espírito público e o compromisso com o interesse coletivo, para que o CG-IBS cumpra seu papel de forma técnica, transparente e eficiente.

Fonte: JOTA