Ainda que o imposto seletivo seja uma modalidade de tributo usual em outros países que implementaram
Enviado Sexta, 18 de Outubro de 2024.Impostos sobre Valor Agregado, inexiste paralelo no direito comparado de uma tributação, pelo imposto sobre o pecado, sobre os bens minerais
A Comissão de Assuntos Econômicos do Senado promoveu, na semana passada, audiência pública para debater o imposto seletivo na Reforma Tributária. O momento talvez não tenha sido dos melhores, uma vez que o mundo político estava na ressaca das eleições municipais e, talvez, o tema não tenha recebido a atenção merecida.
Ainda assim, convém estarmos atentos para o tema em face das inúmeras polêmicas que cercam a regulamentação da reforma, como aquelas que dizem respeito ao Imposto Seletivo. Até a última contagem, havia mais de 1.300 emendas apresentadas ao projeto — uma média de 16 emendas por senador da Casa. Delas, 124 tratam do Imposto Seletivo, representando 10% das emendas, e destas, 13 emendas tratam exclusivamente da retirada dos dispositivos que autorizam a cobrança do Imposto Seletivo sobre exportações.
O tema é sensível e tem potencial para causar enorme prejuízo à balança comercial brasileira, além de tratar de disposição que, certamente, será judicializada. Afinal, a Constituição consagra a imunidade tributária das exportações — um princípio básico de qualquer país civilizado, no sentido de que "não se exportam tributos".
O referido princípio, inclusive, é garantido por boa parte do texto da Reforma Tributária, com previsões expressas de que os novos tributos na modalidade de valor agregado — o IBS e a CBS — não incidirão sobre os bens exportados. O mesmo vale em relação ao Imposto Seletivo, que não onerará as exportações, salvo pela previsão constante do projeto de regulamentação que autoriza a incidência do imposto sobre a exploração mineral. Ou seja, o projeto a ser analisado pelo Senado garante a imunidade na exportação de produtos que serão tributados pelo Imposto Seletivo, tais como bebidas alcoólicas, refrigerantes e cigarros, mas permite a tributação dos chamados bens extraídos que, na atual redação, compreendem o minério de ferro e derivados do petróleo, inclusive o gás natural.
Essa exceção seletiva, na verdade, demonstra a deturpação do propósito do Imposto Seletivo, que seria o de desincentivar o consumo de bens nocivos à saúde ou ao meio ambiente. O ferro é essencial para toda a indústria, inclusive aquela que utiliza o minério na produção de bens benéficos ao meio ambiente, como as torres das usinas de energia eólica, painéis solares e tantos outros.
A verdade é que, ao mirar na exportação dos principais produtos da balança comercial brasileira, o imposto seletivo revela sua verdadeira face: o de ser (mais) um instrumento arrecadatório. Com isso, muda-se o sistema vigente atual, uma vez que os Impostos que serão substituídos pela Reforma Tributária (o ICMS, o PIS, a COFINS etc.) jamais incidiram sobre a exportação de bens minerais.
Ainda que o imposto seletivo seja uma modalidade de tributo usual em outros países que implementaram Impostos sobre Valor Agregado, inexiste paralelo no direito comparado de uma tributação, pelo imposto sobre o pecado, sobre os bens minerais. Muito menos sobre a exportação! Se aprovada a regulamentação da Reforma Tributária da forma como se encontra o texto, o Brasil terá não apenas uma, mas duas novas jabuticabas tributárias.
As invenções legislativas ainda contrariam uma das mais bem-vindas promessas da Reforma, que é a de simplificação do sistema tributário nacional. Ao criar a regra de tributação das exportações, o projeto de regulamentação foi além e também determinou a alteração da base de cálculo do imposto nesta hipótese, que obedecerá a um "valor de referência", ainda não determinado.
É esperado que a atribuição desse valor de referência, que poderá não corresponder ao custo da operação, seja mais um fator de complicação e questionamento judicial e administrativo, uma vez que os critérios da base de cálculo não serão definidos pelo Legislativo, mas, sim, por Ato do Executivo, o que impede a participação democrática dos contribuintes nesse processo normativo e traz dúvidas sobre quais critérios serão escolhidos.
Torcemos, portanto, que o Senado se atente para os riscos jurídicos e econômicos inerentes à hipótese esdrúxula de tributação dos bens minerais nas exportações, e, com isso, resguarde os mais básicos princípios tributários, protegendo a competitividade das empresas brasileiras e evitando o inevitável litígio dos próximos anos.
Fonte: Jornal Correio Braziliense