Estado prevê aumento de 72% no déficit em 2025; funcionalismo teme que agravamento da situação interfira em pagamentos de salários

Enviado Quarta, 02 de Outubro de 2024.

Projeto de 2025 enviado para a Assembleia Legislativa do Rio (Alerj) estima uma receita de R$ 107,5 bilhões

O Projeto de Lei Orçamentária Anual (PLOA) de 2025 enviado na noite desta segunda-feira pelo Governo do Estado para a Assembleia Legislativa do Rio (Alerj) estima uma receita de R$ 107,5 bilhões, frente a uma despesa de R$ 122,1 bilhões. Com isso, a previsão para o ano que vem é que o déficit orçamentário atinja R$ 14,6 bilhões, dos quais R$ 11,6 bilhões se referem à dívida com a União, de acordo com o Executivo. O valor é 71,7% maior que o déficit previsto para este ano, de R$ 8,5 bilhões.

A relação entre receita e despesa também ficou acima da previsão inicial dos técnicos do estado, que em abril trabalhavam com a possibilidade de que as contas do ano que vem fechassem com R$ 13,7 bilhões no vermelho. Apesar dos números negativos, o governo reforçou ontem que “o pagamento de salários e fornecedores é prioridade e está assegurado, e, por isso, vem mantendo tratativas para melhorar as condições de sustentabilidade fiscal do estado, sobretudo com a renegociação da dívida”.

O funcionalismo teme, no entanto, que o agravamento da situação do caixa interfira nos pagamentos de salários. O presidente do sindicato dos servidores da Fazenda estadual, Eduardo Mendes, afirmou que a situação gera insegurança:

— Os servidores já enfrentaram crises anteriores com atrasos nos salários e benefícios. Essa previsão desse déficit para 2025 nos coloca em alerta. Não podemos descartar a possibilidade de medidas de contenção que afetem diretamente os trabalhadores.

A série histórica das LOAs apresentadas à Alerj desde 2015 compõe um retrato das dificuldades enfrentadas pelo estado na última década. No período — que abarca os governos de Luiz Fernando de Souza Pezão, Wilson Witzel e Cláudio Castro — foram seis anos com previsão de déficit, quatro com contas zeradas e apenas um, 2015, com um pequeno superávit da ordem de R$ 2,6 milhões. O pior cenário foi o previsto para 2021, quando o estado estimou que fecharia o ano com R$ 20,2 bilhões no vermelho.

O economista André Marques, professor do Insper, lembra que, nos últimos anos, as contas do estado nunca estiveram bem:

— Houve momentos menos e mais ruins, mas nunca bons. Tanto é que, durante todo esse período, teve o Regime de Recuperação Fiscal, depois teve a revisão do ajuste, aí entram com pedido de liminar (concedida pelo STF, que fixou o pagamento da dívida em R$ 4,9 bilhões por ano, valor pago em 2023), ocorreu uma discussão longa em relação à Cedae... Nunca teve um momento de paz orçamentária definitiva de fato nos últimos anos.

Para a deputada estadual Martha Rocha (PDT), a sinalização é de um momento difícil para o estado do ponto de vista financeiro.

— Não pode esquecer que em 2022, há menos de dois anos, o governo dizia que estava navegando em bons ventos, elogiava a sua própria saúde financeira. O governo vem dando sinais de fracasso na condução financeira do estado. A gente vai chegar a um ponto em que o próximo passo será o atraso de pensões, aposentadorias e salários — alerta a deputada.

Líder do PSOL, o deputado Flávio Serafini acentua que existe um problema real, que é o de o estado ter uma dívida com a União “impagável e extorsiva”, que precisa ser renegociada. Por outro lado, segundo o parlamentar, o estado se comporta como se não estivesse em Regime de Recuperação:

— O descontrole de gastos é visível. O Iterj (Instituto de Terras e Cartografia do Estado do Rio de Janeiro), por exemplo, vem fazendo intervenções urbanas, asfaltamento de ruas, construção de praças.

Comissionados em alta

Dados de agosto do Caderno de Recursos Humanos do governo mostram que o número de comissionados também vem crescendo na administração direta e indireta. No mês passado, eram 12.192 com um gasto mensal de R$ 63,25 milhões. No mesmo mês de 2023, o estado pagou R$ 53,51 milhões a 10.901 comissionados. Em 2020, os números eram ainda menores: 9.302 comissionados, com R$ 32,93 milhões de gasto mensal.

Dos R$ 107,5 bilhões de receitas estimadas pelo PLOA 2025, R$ 80,5 bilhões são próprios e R$ 26,9 bilhões são de outras fontes. Os maiores gastos são com a previdência (R$ 31,8 bi), seguida por segurança (R$ 19,3 bi), saúde (R$ 12,2 bi) e educação (R$ 10,4 bi). As áreas de cultura, habitação e saneamento vão perder recursos em relação a este ano.

— A verdade é que o que se antecipa é uma rota de grande dificuldade para o estado. Enquanto isso, projetos que poderiam aumentar a arrecadação estão tramitando na Assembleia e o governo não se empenha em pautá-los — aponta o deputado estadual Luiz Paulo (PSD), listando por exemplo o projeto que prevê cobrança de IPVA sobre embarcações de lazer e aviões executivos.

O projeto orçamentário para 2025 também contempla as emendas parlamentares impositivas. O valor chega a quase R$ 203 milhões, garantindo a cada deputado R$ 2,9 milhões, R$ 200 mil a mais em relação a este ano.

Votação em dezembro

O pagamento da dívida do estado com a União previsto no PLOA leva em consideração o valor total (R$ 11,6 bi) e não o fixado na liminar do STF (R$ 4,9 bilhões), que pode ser mantida ou não. Outra questão pendente que pode interferir a favor do Rio nessa disputa é o Projeto de Lei Complementar 121/2024 já aprovado no Senado e que atualmente tramita na Câmara. Se aprovado, o PLC permite aos estados e ao Distrito Federal renegociar as dívidas com a União e pagar os débitos em até 30 anos com juros menores que os praticados hoje.

— A maior parte do déficit do estado, 80%, é de dívidas com o governo federal — afirmou o governador Cláudio Castro. — Temos conseguido resultados importantes, como o avanço no Congresso do projeto que cria o Programa de Pleno Pagamento de Dívidas do Estado. Ainda lutamos para que outras importantes reivindicações sejam atendidas.

O cronograma de tramitação do PLOA prevê a votação de sua admissibilidade pela Comissão de Orçamento até o dia 22. O texto, então. será discutido pelos deputados, que apresentarão emendas. A redação final deve ser votada até 12 de dezembro.

 

Fonte: O Globo