Projeto que regulamenta reforma tributária limita questionamentos à compensação por crédito de ICMS

Enviado Quinta, 09 de Maio de 2024.

Texto diz que contribuintes poderão entrar com recurso apenas na Receita Federal; discussão não poderá chegar ao Carf

O projeto de regulamentação da reforma tributária limita a discussão administrativa sobre o ressarcimento das empresas pelo fim dos incentivos estaduais de ICMS com a migração para o novo sistema até 2032 - um montante estimado em pelo menos R$ 160 bilhões. O texto do governo diz que caberá apenas recurso à própria Receita Federal contra as decisões e que o questionamento não poderá chegar ao Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (Carf) - órgão paritário, composto também por representantes do contribuinte.

Consultora técnica da Associação Brasileira das Companhias Abertas (Abrasca), a advogada Tatiana Migiyama afirmou que isso causará insegurança para as empresas porque os créditos não poderão ser discutidos num órgão “que é imparcial e preza pelo controle da legalidade”. “Só vou poder apresentar um recurso hierárquico ao delegado da Receita Federal, órgão que foi quem me negou o crédito. Então provavelmente vou ter negativa desse recurso também”, disse. “Há inúmeras decisões da Receita revertidas no Carf depois.”

Com a limitação, quem discordar da decisão da Receita ou do Comitê Gestor do IBS sobre o valor a ser compensado pela redução de seus benefícios de ICMS, terá que recorrer ao Judiciário. Isso é mais caro, pois exige o pagamento de custas processuais, e a necessidade de depósito em juízo ou apresentação de garantias para ingressar com a ação.

Para a advogada Cristiane Silva Costa, ex-vice-presidente do Carf, “preocupa” que a discussão sobre o contencioso relacionado ao reconhecimento desses créditos esteja restrito à Receita Federal. Ela destaca que, neste caso, não há previsão de sustentação oral, composição colegiada paritária e julgamento público, que podem assegurar efetivamente o contraditório e ampla defesa.

O advogado Marcel Alcades destacou que, como o ICMS vai acabar, a emenda constitucional da reforma determinou a criação de um mecanismo para ressarcir os contribuintes durante o prazo de transição, com a compensação do montante que deixarão de ser beneficiados. Ainda segundo o advogado, seria melhor se os imbróglios em torno desse crédito fossem julgados por especialistas no Carf, mas não são todas as compensações tributárias que serão afetadas.

O governo se comprometeu a pagar pelos menos R$ 160 bilhões para os contribuintes, como forma de compensa-los pela redução gradual dos benefícios tributários que estavam contratados por eles junto aos Estados. Se o valor for maior do que esse montante, a União terá que elevar o repasse. Mas, se for menor, a diferença será repassada para o fundo de desenvolvimento regional, com o objetivo de estimular investimentos estaduais.

Outra questão que ficará restrita a decisão da Receita é a suspensão do pagamento do IBS e da CBS no fornecimento de materiais para exportação. Se houver negativa, não será possível ao contribuinte recorrer ao Carf, apenas ao Judiciário. Além disso, Tatiana Migiyama critica o artigo que prevê o encaminhamento para representação criminal pelo Ministério Público Federal após dez dias da lavratura do ato de infração, sem a possibilidade de discussão no Carf. A Abrasca, que representa as grandes companhias de capital aberto, tentará convencer os parlamentares a alterarem o projeto para ampliar os recursos administrativos.

Procurada, a Secretaria Extraordinária do Ministério da Fazenda para a Reforma Tributária não se manifestou até o fechamento desta edição.

Fonte: Jornal Valor Econômico