Justiça concede medida cautelar que protege Petrópolis contra credores

Enviado Sexta, 31 de Março de 2023.

O Grupo Petrópolis, dono de marcas de cerveja como Itaipava, Crystal, Petra e Black Princess, entrou na segunda-feira (27) com um pedido de recuperação judicial. De acordo com a petição inicial, protocolada na 5ª Vara Empresarial do Rio de Janeiro, o processo reflete a queda de volumes de vendas durante a pandemia, além da escalada dos juros. As dívidas da companhia estão estimadas em R$ 4,4 bilhões.

Dentro do pedido, a companhia requer ainda o bloqueio emergencial de execução de dívidas e a liberação de recebíveis. A Justiça concedeu a medida cautelar e já nomeou os administradores judiciais do processo: Preserva-Ação e o Zveiter Advogados, a mesma dupla responsável por Americanas.

A receita bruta da Petrópolis em 2022 foi de R$ 13 bilhões, queda de 4,4% em relação a 2021.

O advogado da companhia, Gustavo Fontes Valente Salgueiro, diz na ação judicial que a concessão imediata da proteção contra os credores é “indispensável para evitar o iminente estrangulamento do fluxo de caixa” da companhia, e menciona recebíveis bancários a serem depositados nas próximas semanas. O texto explicita os valores que a companhia não quer ver congelados pelos bancos: R$ 215,8 milhões referentes ao Santander, R$ 109,4 milhões do fundo Siena, R$ 47,6 milhões do Daycoval, R$ 9,2 milhões do BMG e R$ 1,1 milhão do Sofisa.

A companhia diz que, sem a concessão da recuperação judicial e a liberação dos recebíveis, passaria a uma posição de caixa negativa de R$ 224 milhões em abril. Com os dois pedidos aceitos, o caixa ficaria positivo em R$ 147 milhões, informa petição.

A empresa alega que a “situação de crise de liquidez” vem se agravando nos últimos 18 meses, refletindo a queda de 31,2 milhões de hectolitros de bebidas vendidos em 2020 para 24,1 milhões de hectolitros em 2022.

Além do portfólio de bebidas, o grupo conta ainda com um braço de geração e comercialização de energia elétrica, após adquirir uma participação na Electra Power em 2010. Detém ainda as sociedades agropecuárias Retiro do Rio, em Petrópolis (RJ), e Nova Guaporé, em Cuiabá (MT).

A participação de mercado da cervejeira, de acordo com o processo judicial, também sofreu um baque na pandemia. Em agosto de 2022, o índice era de 10,6%, sendo que em 2020 havia alcançado patamar de 15,3%.

O texto informa que a empresa foi fundada na cidade de Petrópolis, na serra do Rio de Janeiro, com portfólio de bebidas alcoólicas e não-alcoólicas.

Seu fundador é Walter Faria, que chegou a ser preso, em agosto de 2019, durante a operação Lava Jato, acusado de lavagem de dinheiro em esquema de pagamento de propina na Odebrecht. A acusação era de que o empresário fazia pagamentos ilícitos trocando reais, no Brasil, por dólares em contas titularizadas no exterior. Em novembro de 2019, Giulia Faria, filha do empresário, assumiu as rédeas do grupo.

Naquele ano, de 2019, antes da pandemia chegar ao país, o Grupo Petrópolis tinha 14,5% do mercado de cerveja, em volume. A Ambev liderava, com 59,1%. E a Heineken vinha em segundo lugar, com 22,5%, segundo dados da Nielsen.

Faria ficou aproximadamente quatro meses em prisão preventiva. Em 2020, passou um mês internado em tratamento para a covid-19. Em setembro de 2021, o ministro Ricardo Lewandowski, do Supremo Tribunal Federal (STF), suspendeu duas ações penais nas quais Faria era réu.

A defesa do empresário pediu extensão de uma decisão anterior de Lewandowski que beneficiou o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva: a declaração de nulidade das provas colhidas a partir do acordo de leniência da Odebrecht. Lewandowski entendeu que, assim como no caso do petista, o Ministério Público Federal (MPF) e a Justiça Federal “fizeram amplo e irrestrito uso” da leniência ilegal nos processos contra o empresário, originados da 62 fase da Operação Lava-Jato.

Procurado, o grupo Petrópolis não retornou as ligações do Valor.

O impacto da crise da dona da Itaipava

O processo de recuperação judicial do Grupo Petrópolis, dona da Itaipava, a terceira maior cervejaria do país, pode impulsionar a receita média do setor e favorecer Ambev e Heineken no mercado brasileiro, diz o Bank of America (BofA).

Os analistas Isabella Simonato, Guilherme Palhares e Fernando Olvera escrevem que a Itaipava, principal marca da Petrópolis, é vendida a desconto de 5% a 10% sobre outras marcas. Caso perca mercado, o faturamento médio pode aumentar.

“Além disso, Ambev e Heineken trabalham com redução de exposição a marcas mais populares. Se a Ambev capturar 75% dos volumes da Petrópolis, pode aumentar seus volumes em 16% e Ebitda em 7%”, calculam. O banco destaca que os preços de cerveja aumentaram no primeiro trimestre, mesmo com várias iniciativas promocionais do setor, em meio a estabilidade na taxa de desemprego e inflação controlada.

O analista Gustavo Troyano do Itaú BBA escreveu que a Petrópolis já vinha com problemas operacionais nos últimos anos, com dificuldades de investimentos em suas marcas, perdendo participação de mercado, e favorecendo Ambev e Heineken. Para o Credit Suisse, a Ambev está bem posicionada para se aproveitar da recuperação judicial da Petrópolis, tanto em termos de portfólio de produtos quanto de distribuição.

 

 

Fonte: Jornal Valor Econômico