Proposta do Rio para o Regime de Recuperação Fiscal eleva gastos e prevê reajuste anual a servidores
Enviado Terça, 11 de Janeiro de 2022.O estado do Rio de Janeiro apresentou proposta ao Tesouro Nacional, na última semana, para voltar ao Regime de Recuperação Fiscal. Ao invés de cortar gastos, como é esperado nesse mecanismo, o projeto amplia despesas por oito dos próximos nove anos – e prevê reajustes anuais aos servidores do estado.
Segundo os documentos divulgados, o Rio prevê um "desajuste" nos oito primeiros anos, de 2022 a 2029, em que a despesa cresceria R$ 37 bilhões e a receita aumentaria apenas em R$ 18 bilhões.
Já em 2030, último ano do programa, há um ajuste radical, com corte brutal de investimentos e grande arrecadação estimada em royalties e outras participações especiais.
O Regime de Recuperação Fiscal foi criado em 2017 para estados em situação financeira muito grave. Dos três elegíveis à época (Minas Gerais, Rio Grande do Sul e Rio de Janeiro), apenas o Rio conseguiu entrar na primeira versão. Durante os três anos que permaneceu no programa, o Rio deixou de pagar mais de R$ 60 bilhões em dívidas com a União.
A entrada no RRF permitiu que o estado voltasse a pagar os salários dos servidores em dia. Por decisão judicial, o Rio ainda está sem pagar outros R$ 30 bilhões desde que solicitou entrar no novo RRF – remodelado pelo Congresso e que estende para nove anos o programa.
O blog leu os mais de 100 documentos que o Rio divulgou na proposta de novo RRF, publicada na sexta-feira no Diário Oficial do Estado. Adicionalmente, consultou dois especialistas em contas públicas com passagem pela área econômica do governo federal. Ambos cariocas: Marcos Mendes, professor e pesquisador do Insper, e Bruno Funchal, ex-secretário especial do Tesouro e Orçamento.
Mendes e Funchal avaliam que não há controle de despesas, nem corte de benefícios tributários, nem redução de custo com pessoal. Pelo contrário: além de reajustar os salários, o plano não corrige sequer a taxa de crescimento vegetativo da folha de pagamentos.
"O plano apresentado pelo Rio não está em linha com o espírito do RRF. Para isso, o plano precisaria trazer o controle das despesas do estado para que o ajuste das contas fosse realizado de forma gradativa. Nenhuma dessas condições são observadas, o que compromete muito a credibilidade do plano apresentado", disse Bruno Funchal.
“É claramente um plano que não se sustenta, não faz cortes nos oito primeiros anos e então, no último ano, magicamente a arrecadação dispara e a despesa desaba. Não dá nem para sentar para conversar”, diz Marcos Mendes.
A proposta do Rio precisa ser avaliada e aprovada por três instâncias para ser aceita pelo Ministério da Economia: o Conselho de Supervisão do Regime de Recuperação Fiscal do estado, o Tesouro NacionalRS e a PGFN.
Caso um deles não dê aval, o plano é rejeitado – e o Rio teria que voltar a pagar sua dívida com a União.
Ao apresentar um diagnóstico da situação fiscal do estado e uma proposta para sair da crise, o documento afirma que o Rio precisa ampliar investimentos e elevar subsídios a setores da indústria para dinamizar sua economia.
A proposta diz ainda que o Rio tem uma economia frágil, e que não foi devidamente compensado pela União por ter deixado de ser capital federal.
“O mais grave é o Rio afirmar que precisa gastar mais. Este raciocínio é o que levou o Brasil a uma de suas maiores crises, com recessão. O problema é que esse gasto seria bancado pelo restante do país”, diz Mendes.
Mendes compara a situação do Rio com a do Espírito Santo, estado vizinho que recebe menos em royalties, mas está em situação fiscal muito melhor.
“O Rio é o estado que mais recebe royalties do Brasil. Se fossem recursos bem aplicados, os cariocas estariam em situação muito melhor”, disse.
Dentro do governo, há o temor de que o Rio use a pressão parlamentar ou mesmo apele para liminares judiciais para ter seu plano aceito.
Marcos Mendes afirma que, em muitos casos, o Supremo Tribunal Federal (STF) e o Congresso premiam a pouca responsabilidade das gestões estaduais – concedendo perdão de dívidas, suspensão de pagamentos ou liberando recursos extras.
“Se este plano for aceito pelo Executivo ou imposto pelo STF, irá matar o Regime de Recuperação Fiscal para todos os demais estados", diz o economista.
Fonte: Portal G1 - Por Ana Flor