Possibilidade de inclusão do IBS e CBS no cálculo de outros tributos poderá gerar judicialização
Enviado Sexta, 12 de Setembro de 2025.Reforma não trata da exclusão, o que pode resultar em aumento de carga tributária
As disputas judiciais intermináveis sobre a inclusão de um tributo na base de cálculo de outro correm o risco de se repetirem com o Imposto (IBS) e a Contribuição sobre Bens e Serviços (CBS). Embora a reforma tributária tenha vindo para simplificar o atual sistema, deixa em aberto, segundo tributaristas ouvidos pelo Valor, se as empresas no lucro presumido e no regime de tributação do Simples Nacional deverão incluir o IBS e a CBS no cálculo do Imposto de Renda (IRPJ) e da CSLL.
A lógica, afirmam os especialistas, seria seguir o desenho do Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI), sem essa inclusão. Porém, há receio de a Receita Federal manter o atual entendimento pela semelhança entre o IBS e a CBS com os atuais tributos. A falta de uma definição, por meio da emenda constitucional ou da regulamentação, acrescentam, poderá resultar em judicialização em breve. O período de transição da reforma já começa no ano que vem.
Existe a dúvida porque a base de cálculo do IRPJ e da CSLL no regime do lucro presumido (faturamento anual de até R$ 78 milhões) e no Simples (de até R$ 48 milhões ao ano) é a receita bruta. Para os tributaristas, tributos não integram esse montante, porém a interpretação da Receita em situações similares não foi essa. No regime do lucro real, ainda que os tributos sejam reconhecidos na receita bruta, depois eles são retirados como “despesa”.
A discussão é sobre a contabilização do IBS e da CBS, segundo Daniel Loria, sócio do Loria Advogados e ex-integrante da Secretaria Extraordinária da Reforma Tributária. Para ele, os valores não deveriam entrar na receita porque o IBS e CBS são tributos sobre o consumo e o contribuinte, de fato, é o consumidor final. As empresas, acrescenta, serão apenas as recolhedoras.
Existem duas formas de resolver esse ponto, segundo Loria: uma mudança em lei ou por discussão interpretativa - sendo a primeira forma a mais segura. “Se deixar em aberto e for para interpretação pode gerar litígio”, afirma o especialista.
Sendo IBS e CBS tributos destacados na nota fiscal, devem ser contabilizados como o IPI, tributo recuperável, que gera um ativo no balanço patrimonial e não afeta a receita bruta, segundo Gustavo Vettori, professor na Faculdade de Economia e Administração (FEA) da USP e sócio do Vettori, Rubinstein e Foz Advogados.
Para o advogado, também contaria para a exclusão da base de cálculo do IRPJ e CSLL a decisão do Supremo de que ICMS destacado na nota fiscal e não recolhido configura apropriação indevida e que o imposto estadual está fora do conceito de receita para ser tributado pelo PIS e pela Cofins.
“O IBS e a CBS se assemelham ao IPI e foram as características desse tributo que o afastaram da receita. Mesmo quando se entendia que o ICMS estava na receita bruta, nunca se falou de incluir o IPI na receita bruta. Por isso, IBS e CBS deveriam ficar fora”, afirma Vettori.
Fabio Silva, professor no FGV Law e sócio do mesmo escritório, pontua que se IBS e CBS ficarem fora da receita bruta, haverá um efeito indireto da reforma tributária de reduzir a arrecadação do Imposto de Renda e da CSLL das empresas no lucro presumido e Simples. Isso porque ICMS, ISS, PIS e Cofins hoje integram a base desses tributos. “Não é uma queda significativa, fica em torno de 1%, mas existe”, diz.
A retirada dos novos tributos também poderia ter outro efeito: o de incluir mais empresas no lucro presumido. Aquelas que hoje ultrapassam o teto de R$ 78 milhões por ano, com os impostos incluídos no faturamento, poderiam ficar abaixo desse limite com a exclusão do IBS e da CBS, afirma Silva.
Por outro lado, os tributaristas pontuam que se a Receita assemelhar IBS e CBS a ICMS, ISS, PIS e Cofins, que estão na receita bruta, como a base de cálculo será inflada, haverá um aumento de carga tributária. Não há, por enquanto, essa manifestação.
“Se, no futuro, a Receita indicar que estão na receita bruta [IBS e CBS], acabará criando um contencioso gigante porque as empresas no regime presumido vão alegar que a base de cálculo está majorada e vamos voltar à discussão da ‘tese do século’”, afirma Silva, em referência à exclusão do ICMS da base do PIS e da Cofins, em julgamento do Supremo Tribunal Federal (STF) que levou décadas para terminar.
Para Gustavo Vettori, é necessária uma previsão legal clara. “É papel do Congresso legislar e esclarecer. A solução mais simples é excluir da base”, afirma ele. Eventual perda de arrecadação com a exclusão, acrescenta o especialista, poderá ser compensada com percentual da alíquota no lucro presumido.
“A própria reforma tributária traz os princípios da transparência, da cooperação. Esse assunto deveria ser definido antecipadamente, para evitar que no futuro sejam dadas interpretações distintas, gerando um contencioso que pode contrariar princípios da reforma”, diz Vettori.
Procurada pelo Valor, o Ministério da Fazenda não deu retorno até o fechamento da edição.
Fonte: Valor Econômico