Chamando para atualizar o Estado brasileiro

Enviado Segunda, 16 de Junho de 2025.

O Doge, a agência de eficiência governamental criada por Donald Trump e Elon Musk, foi feito de maneira destrambelhada, por isso é um fracasso. Serve como chamado para atualizarmos o Estado brasileiro de maneira responsável.

Uma ótima oportunidade é o grupo de trabalho (GT) instituído pelo presidente da Câmara, Hugo Motta (Republicanos-PB), e coordenado pelo deputado Pedro Paulo (PSD-RJ), que realizou sua primeira reunião na última terça-feira em Brasília.

A ministra da Gestão, Esther Dweck, se comprometeu a colaborar. Os sindicatos e o setor privado estão convocados já na semana que vem. Tudo como deve ser. Precisamos de pautas construtivas, sem gambiarras.

Após três avanços no último ano — o Enem dos Concursos, uma nova lei de concursos públicos e a renovação da Lei de Cotas para o serviço público —, devemos nos debruçar sobre três outras áreas: supersalários, simplificação de carreiras e gestão de desempenho.

Solucionar os supersalários deveria ser o cartão de visitas da reforma. Temos de rever e restringir o PL 2.721/21, do final do ano passado, pois foi um passo atrás. Estudo da República.org e da Transparência Brasil sobre o Projeto de Lei avalia que 22 benefícios pagos a magistrados, representando R$ 7,1 bilhões em 2024, foram indevidamente considerados indenizatórios. Além disso, sete benefícios remuneratórios viraram indenizações, ao custo de R$ 3,6 bilhões em 2024 — só com o Judiciário. Agora é rever, economizar parte desse dinheiro e dar aumentos às carreiras que precisam.

Sobre simplificação de carreiras, o governo já estabeleceu diretrizes para criação ou reestruturação. Falta encarar o sistema como um todo. Hoje com 351 cargos e carreiras só no Executivo federal, é urgente extinguir as ocupações obsoletas, fundir aquelas com tarefas sobrepostas e reorganizar salários com base em complexidade de funções. Um exemplo: no governo federal 39 carreiras similares têm diferenças salariais que ultrapassam 100%. O mesmo trabalho pelo dobro do custo.

É fundamental implementar a gestão de desempenho, impondo objetivos e resultados-chave para órgãos públicos e servidores, com transparência, estrutura de governança e políticas de reconhecimento e desenvolvimento. Metas servem como ferramenta para comunicação e para produtividade.

O objetivo final não é punir o servidor, mas sim melhorar o atendimento ao público. O funcionário que não estiver comprometido com o serviço público de excelência deve ser acompanhado por seus superiores, mais bem treinado e, se por três ou quatro avaliações anuais negativas consecutivas não demonstrar capacidade e espírito público, deve ser responsabilizado.

Para que as mudanças sejam efetivas, é fundamental que alcancem estados e municípios. Um caminho é realizar alterações constitucionais autorizando leis nacionais sobre os temas em debate, hipótese em debate junto ao GT.

Também é preciso rever a estrutura organizacional do Estado por meio de correções no Decreto-Lei 200 e da instituição de uma lei nacional das contratações temporárias, como apontou recentemente Carlos Ari Sundfeld em artigo no GLOBO.

Além disso, é necessário que o governo federal exerça papel de coordenação federativa e atue como indutor de transformações nos demais entes. É possível gastar menos e melhor com uma reforma do Estado, levando mais qualidade de vida a todos os brasileiros. Isso se dá por meio de melhor organização e qualificação de quem trabalha nos governos.

Esperamos que o Ministério da Gestão e a Câmara dos Deputados trabalhem na mesma direção, com objetivos claros. Assim é a boa gestão de qualquer projeto.

O resto é perda de tempo precioso — e memes, como os de Elon Musk delirando no Salão Oval.

- Ana Luiza Pessanha, Fernanda Melo, Paula Frias e Guilherme Coelho trabalham na República.org, organização dedicada a promover a excelência no serviço público brasileiro

Fonte: O Globo - Opinião