O dinheiro do petróleo no Brasil
Enviado Segunda, 09 de Junho de 2025.Valor recebido por Maricá tem superado a soma do valor repassado a todos os Estados não confrontantes do pré-sal juntos
A imprensa noticiou recentemente que a Prefeitura de Maricá pretende adquirir o controle da SAF do Vasco da Gama. O dinheiro para a transação sairia do fundo soberano do município, que “já está batendo na casa dos R$ 2 bilhões”, segundo informou o prefeito. A fonte de recursos do fundo é a receita da indústria do petróleo.
O valor de royalties e participação especial recolhidos pelas empresas que produzem petróleo e gás natural no Brasil é compatível com nossa condição de grande produtor: foram aproximadamente R$ 100 bilhões em média nos últimos quatro anos. Esse bolo é repartido em quatro partes. A União fica com pouco menos de 40% do total. Pouco mais de 30% vão para os Estados confrontantes aos campos do pré-sal - Rio de Janeiro, Espírito Santo e São Paulo. Pouco menos de 25% são destinados aos municípios litorâneos desses três Estados (como Maricá), e para alguns municípios que, embora não localizados na costa, têm instalações usadas na cadeia do petróleo. Os cerca de 6% restantes vão para um fundo especial do petróleo e são então divididos em duas partes iguais. A primeira metade é rateada entre todos os demais Estados do Brasil e a segunda entre todos os demais municípios do país. O critério de rateio é o mesmo usado para distribuição dos recursos dos fundos de participação de Estados e municípios.
O valor recebido por Maricá (menos de 250 mil habitantes) tem superado a soma do valor recebido por todos os Estados não confrontantes do pré-sal juntos. É isso mesmo. Foram R$ 4,2 bilhões em 2024, enquanto Pernambuco e Ceará, ambos com população superior a 9 milhões de habitantes, receberam menos de R$ 70 milhões cada um.
Essa forma de divisão resulta da aplicação de regras já antigas, aprovadas durante o longo período em que o Brasil produzia (pouco) petróleo em terra ou em campos muito próximos ao litoral. Quando vieram as descobertas do pré-sal, o Congresso Nacional se deu conta de que o critério de distribuição precisava mudar. Aprovou então a Lei 12.734/2012, cujas regras distribuem recursos entre os Estados de forma menos concentrada naqueles que confrontam as áreas de produção no mar, que ainda assim continuam a ser os grandes recebedores. A lei impõe também um limite aos valores recebidos por municípios. Mas o novo regime não chegou a entrar em vigor. Em março de 2013, o STF atendeu pedido de medida cautelar em ação de inconstitucionalidade proposta pelo Estado do Rio de Janeiro para suspender as novas regras.
A lei de 2012 parte daquilo que manda a Constituição Federal: os hidrocarbonetos são recursos da União, e a receita de sua exploração deve ser compartilhada com os demais entes da federação. Mais de 95% da produção de petróleo do país ocorre offshore e os maiores campos se situam a uma distância superior a 200 km da costa. Trata-se de uma faixa do espaço marinho que juridicamente não integra sequer o território da União, que dirá de Estados ou municípios. A Convenção das Nações Unidas sobre o direito do mar dispõe que o Estado costeiro tem direitos de soberania para a exploração e aproveitamento dos recursos naturais em sua zona econômica exclusiva, mas não titularidade sobre esse espaço.
Fonte: Valor Econômico