Tesouro prevê dívida em 81,8% do PIB em 2027

Enviado Terça, 17 de Dezembro de 2024.

Governo estima trajetória estável após atingir pico, mas projeção de mercado é mais alta

O Tesouro Nacional projeta que a dívida pública vai se estabilizar somente em 2028, após atingir o pico de 81,8% do Produto Interno Bruto (PIB) em 2027, segundo o relatório de projeções fiscais divulgado ontem. Apesar da piora em suas próprias projeções, as perspectivas do órgão ainda são bem melhores quando comparadas à mediana do mercado, que prevê dívida de 88,9% do PIB em 2028.

A projeção oficial mais recente do governo, do Projeto de Lei de Diretrizes Orçamentárias (PLDO), indicava estabilização da Dívida Bruta do Governo Geral (DBGG) 2028 em 79,6% do PIB. O secretário do Tesouro, Rogério Ceron, já havia antecipado ao Valor, no fim de setembro, que o órgão pioraria suas projeções a esses patamares.

Segundo o relatório, a DBGG deve encerrar este ano em 77,7% do PIB, ante 76,6% previsto na PLDO, enviado ao Congresso em abril. Em 2028, de acordo com as projeções do Tesouro, a DBGG inicia movimento decrescente e atinge 75,6% do PIB em 2034. “Espera-se um aumento da DBGG/PIB de 3,3 p.p. em 2024 em comparação ao valor realizado em 2023. Essa alta esperada se explica, principalmente, pelo nível dos juros nominais, que seguem pressionando a dívida nos anos seguintes”, assinalam os técnicos do Tesouro.

“As expectativas de resultados primários positivos e de redução dos juros/PIB serão determinantes para assegurar a trajetória de queda da DBGG/PIB no médio prazo para além das estimativas feitas no cenário de referência em questão”, informa o Tesouro no relatório.

Essas projeções são feitas no chamado “cenário de referência”, que considera o cumprimento das metas já sinalizadas pelo governo. No chamado “cenário inicial”, no qual o Tesouro desconsidera algumas medidas de arrecadação ainda não aprovadas, como aumento da Contribuição Social sobre Lucro Líquido, da alíquota do Imposto de Renda sobre Capital Próprio (CJP), a dívida atingiria 83,1% do PIB em 2028 e 2029, quando só em 2030 começaria a cair.

Segundo o Tesouro, um resultado primário equivalente a aproximadamente 0,7% do PIB em 2028 seria necessário para estabilizar a dívida em 81,8% do PIB naquele ano.

Além disso, os técnicos também assinalam que, após estabilizar a dívida, para reduzir a DBGG/PIB para 74,4% ao final de dez anos (o mesmo nível de dezembro de 2023) “calcula-se que seria necessário um resultado primário médio de 1,3% do PIB entre 2025 e 2034, exigindo um esforço fiscal ainda maior do que o previsto no cenário de referência”.

As projeções oficiais do governo são bem mais otimistas do que as do mercado, que não prevê uma estabilização no médio prazo. Segundo a mediana do Boletim Focus, do Banco Central, divulgado ontem, o mercado prevê uma dívida em 78,3% do PIB ao fim deste ano. Em 2033, por exemplo, os agentes econômicos projetam que a DBGG estará em 93,1% do PIB, ante 77,3% da previsão do Tesouro Nacional.

“As projeções veiculadas pelo governo são irrealistas. Estamos muito distantes de entregar a meta zero, no ano que vem”, avaliou o economista Felipe Salto, sócio da Warren Rena. “Aqui, me refiro ao zero real, para valer. Sim, porque se for para considerar precatórios extra regras fiscais e banda inferior, o governo poderia entregar um déficit de até R$ 75,1 bilhões e ainda cumprir a lei”, complementou.

Para o próximo ano, por exemplo, o relatório de projeções fiscais prevê a DBGG em 79,7% do PIB, ante 81,9% da mediana do Focus.

“A questão é que, para reequilibrar a dívida/PIB, permitir um novo ciclo de redução de juros a médio prazo e aplacar o quadro de descontrole, a tarefa começa agora. Será preciso ir muito além do pacote fiscal, que neste momento corre risco de desidratação no Congresso”, avaliou o economista da Warren.

Tesouro estima que espaço para gasto discricionário não rígido irá se esgotar em 2032

Pelo lado do resultado primário, o Tesouro prevê que o centro da meta fiscal de 2025 poderá ser atingido com um esforço fiscal de apenas 0,1% do Produto Interno Bruto (PIB), o equivalente a R$ 17,9 bilhões em receitas adicionais. Por outro lado, as metas de 2026 a 2028 podem ser descumpridas, caso o governo não seja bem-sucedido no esforço fiscal adicional.

A necessidade de incremento nas receitas é da ordem de 0,7% do PIB em 2026, 0,8% do PIB em 2027 e 1% do PIB em 2028. Os percentuais consideram a arrecadação bruta, antes de transferência para Estados e municípios. O Tesouro explica que as projeções para os anos de 2025 e 2026 não consideram os valores que serão pagos de precatórios fora da meta, por autorização do Supremo Tribunal Federal (STF).

Ainda no relatório, a secretaria do Ministério da Fazenda previu que o limite de despesas do Orçamento vai ter alta real de 2,5% por ano até 2034, ou seja, no limite máximo permitido pelo arcabouço fiscal. No documento anterior, divulgado em março, o Tesouro previa crescimento real médio de 2,2% do limite de despesas entre 2024 e 2034.

Apesar desse crescimento das despesas ao longo do tempo, os gastos discricionários - não obrigatórios, que incluem investimento e custeio da máquina pública - ficarão cada vez mais pressionados. A previsão é que as discricionárias do Executivo caiam de 1,7% do PIB em 2024 para 0,9% em 2034, pressionadas pelos gastos obrigatórios, que vão consumir quase a totalidade do limite de despesas.

A situação piora quando a projeção é para as chamadas as despesas discricionárias não rígidas, ou seja, exceto emendas parlamentares e pisos de saúde e educação, que têm execução obrigatória. A projeção do Tesouro é que o espaço para esses gastos praticamente acabará em 2032, quando está estimado em apenas R$ 3 bilhões. Isso porque o espaço fiscal será todo consumido pelas despesas obrigatórias e pelas discricionárias rígidas (emendas e pisos).

O achatamento dos gastos não rígidos começa a ser visto com mais intensidade em 2027, quando terá apenas R$ 70 bilhões. Técnicos do governo costumam apontar que esse valor é o mínimo necessário para o governo funcionar e investir. Ou seja, a partir de 2028, o governo já teria dificuldades para manter a máquina pública funcionando. Em 2033 e 2034, o dinheiro acabaria totalmente.

Fonte: Jornal Valor Econômico