‘Horizonte fiscal’ muda com decisão do STJ, vê Haddad
Enviado Terça, 25 de Abril de 2023.Julgamento envolve renúncia do ICMS e pode gerar R$ 47 bi
Com o desafio de elevar receitas para fazer o ajuste fiscal sem comprometer políticas públicas, o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, reuniu-se ontem com o ministro do Superior Tribunal de Justiça (STJ) Benedito Gonçalves, relator do processo que discute a exclusão, da base de cálculo do Imposto de Renda da Pessoa Jurídica (IRPJ) e da Contribuição Social sobre o Lucro Líquido (CSLL), dos benefícios do Imposto sobre a Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS) concedidos a empresas.
Depois de adiamentos, o caso pode ser julgado nesta quarta. “Ninguém suporta mais tanta insegurança jurídica, tanto lobby”, afirmou Haddad.
A decisão pode “mudar completamente o horizonte fiscal do país”, avaliou o ministro. Não só por causa dos R$ 47 bilhões em receitas previstas para 2024, mas também pelo sinal que dará sobre como o Judiciário pretende conduzir o debate sobre gastos tributários. É uma conta de R$ 600 bilhões sobre a qual o ministro quer lançar luz, divulgando os nomes dos beneficiados. Sua meta é cortar 25% dela.
Para especialistas, porém, a medida é de difícil aprovação e também há dúvidas sobre seu impacto na arrecadação.
Haddad acrescentou que mandou sua equipe estudar o uso do mecanismo de Juros sobre o Capital Próprio (JCP). Avalia que estão ocorrendo abusos.
São todas iniciativas para recompor a base tributária do Estado, que o ministro considera corroída por benefícios “ilegítimos” e “anômalos”. Sem enfrentar essa agenda, disse, surgem recomendações como a contenção do salário mínimo e outras políticas sociais para ajustar as contas públicas.
Para 2024, o governo espera obter R$ 155 bilhões em receitas adicionais com medidas nessa linha. A proposta do novo arcabouço fiscal tem sido criticada por alguns especialistas por depender excessivamente do aumento de carga tributária. Haddad tem dito que pretende elevar receitas sem criar impostos novos nem elevar alíquotas.
O ministro classificou de “escândalo” o uso do mecanismo de JCP no Brasil. “Bilhões que são drenados dos cofres públicos para beneficiar meia dúzia de empresas que fazem engenharia tributária em cima de um dispositivo legal que hoje está sendo abusado”, afirmou.
Ele comentou que o Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (Carf) discute um auto de infração de R$ 14 bilhões aplicado sobre uma empresa, “por ter artificialmente inflado seu capital e declarado juro sobre capital próprio”.
Sobre a questão do ICMS discutida no STJ, Haddad comentou que o tema “vai acabar” no Supremo Tribunal Federal (STF).
Assim, disse, está pouco preocupado com o impacto fiscal da decisão neste ano. O foco é em 2024, quando o país passa a ter, novamente, um regime fiscal robusto em vez do “carnaval” que se instalou desde 2022. “Qual é o país do mundo que subvenciona custeio?”, questionou. “Foi um jabuti criado ali que criou um ralo de quase R$ 90 bilhões.”
Os benefícios tributários são “a maior caixa-preta do Brasil”, afirmou. Entre os benefícios fiscais previstos em lei, que somam algo como R$ 500 bilhões, e o que não estão em lei, mas na prática são “ralos” abertos na arrecadação, outros R$ 100 bilhões, a conta chega a R$ 600 bilhões. “Dá quase R$ 600 bilhões que a União perde em nome de meia dúzia que fazem lobby no Congresso e no Judiciário.”
“Defendo a explicitação dos beneficiários”, disse. Em entrevista ao jornal “O Estado de S. Paulo”, Haddad prometeu divulgar os CNPJs de todos os que desfrutam de benefícios tributários. E acrescentou que, se depois de tornados públicos os destinatários das desonerações o Congresso Nacional decidir manter os benefícios, será uma decisão legítima da sociedade.
Fonte: Valor Econômico