Fazenda vai atacar sonegação e taxar apostas eletrônicas

Enviado Segunda, 03 de Abril de 2023.

As medidas que a equipe econômica pretende anunciar para alavancar as receitas e dar sustentabilidade ao novo arcabouço fiscal serão focadas em fechar brechas para sonegação de tributos, correção de distorções, redução de gastos tributários e tributação das apostas eletrônicas. Mudanças relacionadas a ajustes no Imposto de Renda, que também estão na mesa da discussão, devem ficar para o segundo semestre.

Na quinta-feira, o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, divulgou o tão aguardado substituto do teto de gastos. Ele informou que, nesta semana, apresentaria as ações que serão adotadas para alavancar as receitas em R$ 150 bilhões e, com isso, dar sustentabilidade ao novo mecanismo.

Dentre as medidas que vêm sendo discutidas, segundo fontes ouvidas pelo Valor, estão o combate à elisão fiscal de multinacionais que prestam serviços no Brasil, mas faturam em sedes em offshore no exterior, e a realização de ajustes nas regras de preço de transferência na exportação para paraísos fiscais. “Estamos tratamos do preço de transferência e de empresas que exportam abaixo do preço para paraísos fiscais”, disse um técnico da área econômica.

No cardápio ainda está a realização de alterações na cobrança de Contribuição sobre Lucro Líquido (CSLL) para corrigir distorções que acabam reduzindo a arrecadação da União. Neste caso, empresas que têm benefício de ICMS estariam usando isso para diminuir pagamento de imposto federal. “A ideia coibir é abusos. Tem muita fraude com interpretações absurdas”, afirmou outro integrante da equipe de Haddad.

Em outra frente, Haddad deverá haver a tributação das apostas eletrônicas. Segundo os técnicos da área econômica, tirando a as apostas eletrônicas que serão reguladas, as demais propostas para aumento de receita têm como objetivo fechar brechas para fraudes e sonegação.

Também está na mesa de discussão uma proposta de alinhamento da tributação dos fundos exclusivos com os demais fundos de investimentos, instituindo o “come-cotas” (cobrança antecipada de Imposto de Renda dos fundos de investimentos), assim como fim do juro sobre capital próprio (JCP) e a taxação de dividendos de Pessoas Jurídicas. Mas, conforme fontes ouvidas pelo Valor, essas medidas devem ficar para o segundo semestre.

Técnicos do governo explicam que Haddad quer manter o compromisso, que vem fazendo em público, de não criar novos impostos nem aumentar alíquotas. Portanto, os ajustes que envolverem IR vão ficar para depois.

Além dessas ações, a equipe econômica anda está fazendo um pente-fino nas desonerações, que neste ano deverão somar R$ 456 bilhões, distribuídos em mais de 80 programas. Mas, neste caso, a expectativa é de que o governo enfrente resistência no Congresso Nacional.

De acordo com dados da Receita Federal, a maior renúncia tributária do país é o Simples, com R$ 88,5 bilhões. Estudos já apontaram que o programa para micro e pequenas empresas tem custo elevado para o número de negócios formalizados. No entanto, o próprio Haddad disse que não tentaria aumentar a arrecadação mexendo no Simples.

A redução dos gastos tributários sempre foi desejo de vários governos. Porém, a ideia acaba não indo para frente devido à dificuldade de aprovação no parlamento. Para tentar fazer a proposta andar desta vez, o Palácio do Planalto pretende centralizar nos ministros Rui Costa (Casa Civil) e Alexandre Padilha (Relações Institucionais) as negociações com o Congresso. Assim, a tendência é que sejam vetadas negociações diretas de integrantes de outras pastas na Esplanada com os parlamentares, a fim de evitar “fogo amigo”.

Interlocutores ouvidos pelo Valor admitem que encerrar as desonerações é uma medida impopular e gera conflitos que terão ser tratados inclusive dentro do próprio governo. Já se prevê “pressão de todos os lados” pela manutenção das isenções de impostos concedidas a diversos setores nos últimos anos. Esses conflitos, no entanto, devem ser tratados internamente.

Auxiliares vêm aconselhando o presidente Luiz Inácio Lula da Silva a dar orientações expressas para que as conversas se concentrem no Palácio, evitando assim uma autossabotagem no governo que inviabilize a efetividade do novo arcabouço fiscal.

Haddad, e a ministra do Planejamento, Simone Tebet, ainda estão definindo que áreas afetadas pelo fim das desonerações. Assim como ocorreu com o arcabouço, a palavra final sobre que setores serão reonerados caberá a Lula.

Na Câmara, apesar de as linhas gerais do novo arcabouço fiscal terem sido elogiadas por lideranças partidárias do Congresso, aliados do presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), avaliam que a eventual inclusão de mudança de desonerações para dar suporte à nova âncora fiscal pode atrapalhar o debate da proposta na Casa.

Interlocutores de Lira reconhecem que a possível decisão do governo de encerrar ou limitar as desonerações seja necessária para aumentar a arrecadação, mas apontam que a medida não deve ser diretamente associada ao arcabouço fiscal para que seja possível o avanço da matéria em pouco mais de duas semanas após sua entrega, prevista para esta semana.

Fonte: Valor Econômico