Pacote fiscal poderá reduzir déficit previsto pela metade

Enviado Sexta, 13 de Janeiro de 2023.

A primeira tentativa de reduzir o déficit fiscal previsto para o ano, de R$ 231,5 bilhões, foi apresentada ontem pelo ministro da Fazenda, Fernando Haddad. Na primeira vez que abordou o tema, o ministro disse que dificilmente o déficit primário seria menor do que os R$ 63 bilhões da estimativa inicial orçamentária, feita antes da aprovação da PEC da Transição, mas que, por outro lado, não seria de forma alguma de 2% do PIB. Entre desejos, intenções e o que é factível, as medidas alinhadas ontem podem prover o meio termo. A intenção de Haddad é diminuir o déficit para menos de R$ 100 bilhões. É importante que o governo tenha decidido reduzir o largo espaço fiscal, obtido de forma inédita antes mesmo de tomar posse.

Como era previsto, os cortes de despesas são a fração menor dos R$ 242,6 bilhões estimados como potencial de ajuste por Haddad. A maior correção está contemplada em ações de receitas permanentes e extraordinárias (R$ 156,6 bilhões). No caso das receitas permanentes, o governo deixa claro que vai acabar com a desoneração da gasolina, o que elevará seu caixa em R$ 28,8 bilhões e com a redução do PIS-Cofins sobre receitas financeiras das empresas, feitas no apagar das luzes do governo de Jair Bolsonaro e que consome R$ 4,4 bilhões.

Uma fatia importante do ganho em receitas permanentes e extraordinárias é incerta. Ao incentivo à redução de litigiosidade no Carf é atribuído um aumento da receitas permanentes de R$ 15 bilhões e de receitas extraordinárias de R$ 35 bilhões, estimativas arbitrárias à volta do voto de desempate do representante da Receita Federal nos litígios judiciais no conselho, cujo fim, em 2020, passou a propiciar ganhos seguidos às empresas no colegiado. Esses itens representam um terço dos ganhos esperados nas receitas do governo.

O aproveitamento dos créditos do ICMS teria um impacto de R$ 30 bilhões. Ele seria proveniente de uma pendenga mal resolvida na decisão sobre a retirada do ICMS da base de cálculo do PIS-Cofins sobre as vendas das empresas, aprovada pelo STF. O Supremo, no entanto, manteve a situação anterior na aquisição de insumos pelas companhias, que passaram a ter abatimento maior dos tributos federais, o que os técnicos do governo consideram uma distorção que precisa ser encerrada.

A parte que pode ser considerada própria do primeiro ajuste, que será consolidado com regras fiscais que substituam o teto de gastos, derrubado por Bolsonaro e exterminado agora, diz respeito a ações que dependem da vontade do governo. As reestimativas de receitas orçamentárias devem contribuir com R$ 36,4 bilhões. É possível que esta previsão seja bastante conservadora e esses recursos sejam superiores a R$ 50 bilhões. Em outra rubrica móvel, que poderá crescer dependendo do desempenho da economia, estima-se que a autorização para uma execução inferior ao que está no orçamento atinja R$ 25 bilhões. Outros R$ 25 bilhões viriam da revisão de contratos e programas, uma praxe na troca de governo cujos resultados são de magnitude incerta.

Há mais economias que não estão relacionadas no pacote do ministro da Fazenda, mas que podem ajudar no resultado primário. O ministro do Desenvolvimento Social, Wellington Dias, listou 10 milhões de cadastros irregulares no Bolsa Família, que serão corrigidos. Basicamente, são famílias que se atomizaram para aproveitar o Auxílio Brasil, que prevê R$ 600 de auxílio por indivíduo. A revisão do Cadastro Único, esculhambado pelo governo Bolsonaro, e a focalização do programa podem proporcionar economias em relação aos R$ 157 bilhões alocados este ano.

Do que depende então de decisão política de governo expressa no pacote, é possível reduzir os gastos previstos em R$ 94,6 bilhões. Isso viria do fim da desoneração de tributos (R$ 33,2 bilhões) e da reestimativa de receitas e autorização para gastar menos (R$ 61,4 bilhões). Só com isso, o déficit primário estimado poderia cair então para R$ 137 bilhões, sem considerar nenhum progresso em outras medidas, que devem ocorrer. Com isso, o rombo fiscal se reduziria a 1,2% do PIB, ainda distante do equilíbrio fiscal, mas a caminho de demonstrar que o governo Lula não é indiferente à questão.

Pacotes são pacotes e a realidade pode driblar todos os planos. O fator decisivo será a nova regra fiscal. A intenção de Haddad, expressa ontem, e a se confirmar, é mostrar que não deverá haver uma farra de gastos.

Fonte: Valor Econômico