Charles herda privilégio tributário e não precisa pagar imposto sobre propriedades que recebeu da mãe

Enviado Segunda, 19 de Setembro de 2022.

Acordo fiscal da década de 1990 determina isenção para o monarca, enquanto os súditos pagam 40% de imposto sobre herança, gerando insatisfação.

Ao contrário dos demais britânicos, o rei Charles III está isento do pagamento de 40% de imposto sobre a herança dos bens que recebeu de sua mãe, entre eles a propriedade do Ducado de Lancaster, avaliada em 652 milhões de libras esterlinas (R$3,8 bilhões).

A benesse se dá graças a um acordo negociado há 30 anos pelo então premiê John Major e a coroa britânica e vem sendo debatida nas redes sociais após a morte de Elizabeth II. Afinal, qualquer pessoa que não seja o monarca paga imposto sucessório sobre imóveis acima do limite de 325 mil libras (R$1,9 milhão).

A exposição da isenção tributária para o soberano caiu mal num momento em que o país está pressionado por inflação de dois dígitos, crise energética e desaceleração econômica. “Por que o imposto sucessório não deve ser pago na propriedade privada da rainha? Por que deveria haver uma regra para o monarca e outra para todos os outros? Um monarca constitucional não deveria ser o nosso igual perante a lei?” questionou o tributarista Richard Murphy, da Universidade de Sheffield, no Twitter.

Editora digital do “Independent”, Alice Murphy expressou amargura sobre o privilégio real, compartilhada em opiniões semelhantes nas redes sociais. “Faça sua parte para ajudar aqueles prejudicados pela crise do custo de vida, Charles. Sente-se com seu povo, que não tem como sustentar seus filhos, que trabalha em dois empregos para manter o gás funcionando, que deve escolher entre comer e aquecer suas casas. Você pode até fazer de mim um monarquista”, escreveu a jornalista.

O chamado memorando de entendimento, no qual o acordo fiscal se baseia, estipula que alguns bens da coroa são ativos públicos e não privados. Portanto, seria inadequada a cobrança de imposto sobre esses ativos, que incluem, por exemplo, o Palácio de Buckingham, a coleção e os arquivos reais. Até aí, tudo bem.

A parte controversa, contudo, diz respeito aos bens privados do monarca, herdados pelo sucessor sem a cobrança do imposto sucessório. Uma das justificativas é de que as propriedades privadas, como Sandringham e Balmoral, onde a rainha faleceu, também são utilizadas para funções oficiais. O acordo não menciona que esses bens também geram receitas para a família real.

“A monarquia como instituição precisa de recursos privados suficientes para permitir-lhe continuar a desempenhar seu papel tradicional na vida nacional e ter um grau de independência financeira do governo da época”, determina o memorando que protege a riqueza da família real.

O mesmo acordo isentou a rainha de pagar imposto de renda. Mas Elizabeth II começou a fazê-lo, voluntariamente, a partir daquele ano de 1993. Como príncipe de Gales e duque da Cornualha, Charles concordou em seguir os passos da mãe e vem contribuindo sobre sua renda e ganhos de capital. No ano passado, o ducado lhe rendeu 20 milhões de libras (R$ 11.8 milhões) e ele pagou a alíquota máxima de 45% sobre seus ganhos. Mas a herança permaneceu de fora.

O jornal “The Guardian” defendeu em editorial que o Parlamento pressione as finanças da família real e faça uma revisão do imposto sobre herança. “Esse negócio precisa ser revisto. As finanças reais são obscurecidas pelo que é propriedade privada e pública”, argumentou o jornal. Ao que parece, Charles não herdou a benevolência que a mãe conquistou junto aos súditos.

Fonte: G1 - Por Sandra Cohen